sexta-feira, 30 de novembro de 2007

"Beijos proibidos" por Júlia Souza


Para quem prefere “personagens” famosos, gente sobre cujas vidas seria possível ler em livros de História, revistas de fofoca ou biografias escritas por “autores best sellers”, certamente o cinema de Truffaut seria uma decepção. O cineasta francês é só para quem presta atenção a detalhes. Beijos proibidos, terceiro filme do diretor com o personagem Antoine Doinel (Jean Pierre Leaud) como protagonista, é representante fiel dessa arte de sutilezas.

O longa começa com Doinel sendo expulso do exército, ao qual tinha sido voluntário preguiçoso, aparentemente, por razoes amorosas. Apesar de já haver adentrado o mundo de seu protagonista nos dois filmes anteriores, Truffaut faz questão de apresentá-lo novamente. E o faz com perfeição quando, mostra Doinel, abstêmio, logo após deixar o quartel, depois de um bom tempo recluso, quase correndo de uma prostituta porque ela age exageradamente profissionalmente.

Ao longo do filme, surge um Doinel apaixonado pela cidade natal –a “Sacre Coeur” é pano de fundo para várias cenas- e fabulosamente desastrado. Tanto o Woody Allen sério e enamorado de Manhattan, quanto o protagonista vacilante das comédias parecem de certa forma haver buscado inspiração aqui.

De certa forma, Beijos Proibidos retrata os pequenos e grandes acontecimentos da cabeça de Doinel. Como ele lida com rejeição, amor, com o passado. Além disso, no entanto, o longa faz rir dos detalhes “de fora para dentro”. Não do que o protagonista sentiu ou pensou, mas simplesmente do que se passou com ele, como acontece nas comédias de Woody Allen e acontecia nos filmes de Chaplin.

A cena em que Doinel é demitido do hotel, primeiro trabalho depois do exército, mostra-o como é a primeira de uma sucessão de trapalhadas. O emprego de detetive que ele consegue depois da (e devido à) demissão é divertido desde ao anúncio nada discreto nos jornais até as “personas” que habitam a agência. A atuação de Doinel como investigador é um capítulo à parte na graça do filme. Assim como o uso que Truffaut faz da cidade, especialmente do Montmatre dão um toque especial à fotografia.

Nenhum detalhe, contudo, chama mais atenção que os diálogos do filme. Tanto aqueles sem palavras, como os de Doinel com ele mesmo até as discussões verborrágicas do protagonista com sua musa. Truffaut não nega que o personagem tenha uma verve autobiográfica, e a interação perfeita entre Doinel, as imagens, as falas e os porquês do filme deixam a impressão de que tudo aquilo já havia se passado... no imaginário do diretor.

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