quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

"300" por Bernardo Cortizo de Aguiar

http://www.youtube.com/watch?v=wDiUG52ZyHQ


Um relato da batalha das Termópilas, ou um relato de um relato? Neste filme de 2007, dirigido por Zack Snyder, vemos uma interessante construção narrativa: baseado numa graphic novel de mesmo nome (escrita e desenhada por Frank Miller, que também fez Sin City) onde o autor admite não ter muito compromisso com uma visão realisticamente histórica, a estória dos 300 espartanos contra o exército persa de Xerxes (Rodrigo Santoro) ganha ares ainda maiores de mito quando percebemos estar sendo contada por Dilios (David Wenham), único sobrevivente dos 300 guerreiros de elite do rei Leônidas (Gerard Butler).

A já famosa história de Leônidas e seus 300 começa quando mensageiros persas, enviados por Xerxes, exigem de Esparta um presente de terra e água como mostra de subserviência ao império Persa. Frutos daquela que deve ser a mais belicosa das sociedades já existentes, e ensinados a nunca se renderem e nunca fugirem, os espartanos respondem à sua maneira, matando os mensageiros. Leônidas, tendo escutado notícias das movimentações do enorme exército persa, decide pela guerra, mas como dita a lei espartana (e nem mesmo um rei pode ir de encontro à lei), ele deve consultar os éforos antes de ter permissão para mandar suas tropas para a guerra. Velhos e decadentes, os éforos são facilmente subornados pelo corrupto Theron, influente político da cidade-estado, juntamente com os persas.

Proibido pelos éforos de juntar seus exércitos em defesa de sua amada cidade, e motivado por Gorgos (Lena Headey), ele decide então “sair para caminhar”, com 300 de seus melhores guerreiros como guarda pessoal. O resto do filme se alterna entre as batalhas do rei e seus 300 e as batalhas políticas de Gorgos, tentando convencer o resto de Esparta a ir ao auxílio de seu rei.

Filmado em cromakey, com fundos inseridos posteriormente, o próprio tratamento visual dado ressalta o filtro fantasioso dado pelo filme: as cores fortes, numa escala construída em torno do bronze dos escudos e dos espartanos, que vão à guerra portando apenas suas espadas, lanças e escudos, dão o tom heróico do filme. Sendo um relato de um homem da época (Dilios), a realidade é exagerada e fantasiada: o exército persa aparece encarregando monstros disformes, bestas exóticas e armas cruéis que, se não possuem nenhum tipo de verdade histórica, elevam Leônidas e seus 300 a um status quase mitológico.

Os atores convencem em seus papéis: desde Butler, como o rei que ama sua cidade-estado mais do que tudo, até Santoro, como o mimado e afetado Xerxes. Os 300, embora na sua maioria não nomeados, passam bem a idéia de soldados loucos por batalhas, para quem a maior glória é morrer lutando. Stelios (Michael Fassbender), embora num papel diminuído em relação à Graphic Novel, ainda rouba a cena com a famosa réplica de “melhor, lutaremos à sombra”, quando ameaçados pelos persas de serem alvos de tantas flechas que o próprio Sol seria bloqueado por elas.

Embora historicamente não tão acurado, a representação do espírito espartano é ótima: treinados desde cedo para serem guerreiros, eram ensinados a atacar os adversários por todos os meios. As respostas sarcásticas e o deboche espartano faziam parte de uma estratégia que visava desestabilizar moralmente o inimigo.

A trilha sonora, com músicas fortes e percussão bastante marcada, auxilia na construção da atmosfera militar/heróica. Os efeitos especiais são bem utilizados e as coreografias de lutas, soberbas. O que talvez estrague um pouco o filme é a ideologia que passa: estado bélico é a última salvação do ocidente (enquanto representante da razão e da democracia) contra as forças do Oriente Médio. Não sei vocês, mas pra mim basta desse conflito fajuto de EUA contra Iraque. Mas, como disse Slavoj Žižek, talvez esse entendimento seja falho e, na verdade, o filme seja a história de um pequeno e pobre país (Grécia) sendo invadido pela superpotência da época (Pérsia), de modo que o jeito como são representados os dois países não seja muito diferente do modo como qualquer país pequeno vê as tropas invasoras.

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