quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

"Bonequinha de luxo" por Bernardo Cortizo de Aguiar


Nesta película de 1961, Audrey Hepburn encarna o seu mais notável papel: Holly Golightly, uma jovem em constante fuga, seja de seu passado, seja da realidade em que vive. Vivendo em Nova Iorque como uma “call-girl”, Holly se envolve com seu vizinho e escritor aspirante, Paul Varjak (George Peppard), ele próprio numa relação incomum com uma mulher o pagando a cada visita em seu apartamento.

Dirigido por Blake Edwards num tom mais ameno do que o romance no qual foi baseado, o filme retrata o desenvolvimento da relação dos dois, junto com suas dificuldades por conta do estilo de vida e de ser de Holly, e sua tendência a buscar soluções escapistas (como querer se casar com um latifundiário brasileiro milionário).

Sendo passado em sua maioria no prédio onde Holly e Paul moram, o filme utiliza de cenas externas para demonstrar o lado mais casual deles: longe de seus apartamentos e de suas vidas, os dois podem ser autênticos e deixar suas preocupações de lado, para, enfim, aproveitarem a vida.

A censura em relação ao texto original (a personagem de Hepburn nunca é referida como prostituta, e toda vez que se fala sobre seu modo de vida, é dito que ela ganha 50 dólares para “ir ao banheiro”) e a alegria um tanto ingênua, junto com a presença do caricato vizinho japonês (interpretado por Mickey Rooney, que não tinha nada de japonês, como não poderia deixar de ser nessa época) deixam a história mais pitoresca e fantasiosa, meio como o modo como Holly Golightly vê o mundo, ao invés de ferir a suspensão de descrença do espectador, como alguns filmes da época fazem. As festas são cheia de tipos, regadas a álcool e bem iluminadas, com pessoas bem-vestidas que se mantém assim até o fim, ao contrário do descontrole esperado num acontecimento deste tipo.

A trilha sonora é um dos pontos altos, com Moon River (composta por Johnny Mercer e Henry Mancini) cantada por Audrey Hepburn tendo ganhado um Oscar por melhor canção original e outro por melhor trilha sonora. As músicas são ótimas representantes da época e a cena de Audrey cantando Moon River na janela de seu apartamento é marcante.

A fotografia é competente, com escolhas muito interessantes de ângulos em alguns momentos (como quando Paul atende o telefone na festa de Holly e se debruça no chão, com direito a um convidando usando-o como cadeira, ou ainda a já referida cena da música Moon River) e enquadramentos claros e efetivos, de acordo com o clima proposto no enredo.

A película é uma deliciosa e icônica representação do cinema hollywoodiano do século XX, com sua visão alegre de temas polêmicos, contrastes vibrantes, frases de efeito clichês e seu happy ending clássico, com a famosa cena na chuva. Aquilo em que mais se distancia da obra original é também o que mais o torna gostoso de ver: uma visão ingênua da vida de uma garota problemática e falha.

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