Na
natureza nada se cria tudo se transforma, segundo o químico Lavoisier. Não só
para a natureza material das reações químicas é valida a regra, mas para toda
manifestação artística. Num mundo em que o novo já perdeu a graça da novidade,
Miguel Gomes conseguindo trabalhar com uma forte intertextualidade com o cinema
de Murnau e nem por isso o seu filme deixa de ter suas peculiaridades. Em Tabu, além da escolha do nome do filme,
como a da personagem Aurora, partirem de nomes de filmes de Murnau; o enredo
também sofre a influência do cineasta alemão quando narra a história de amor
impossível (Tabu, 1931) e a história de traição (Aurora, 1927). Tabu dirigido por Gomes assim como o dirigido por Murnau
é dividido em dois atos, mas enquanto o deste ultimo começa com o paraíso para
depois passar para o paraíso perdido, o de Gomes já começa com a perdição para
depois passar para o paraíso, ou seja, há uma quebra no prólogo, o filme começa
no tempo atual e pula para o passado.
Característica esta que estar presente não só em Tabu, mas também em ‘Aquele
Querido Mês de Agosto’ (2008), produção que pode ser analisada de vários
ângulos.
O
paraíso perdido, primeira parte do filme, gira em torno de três mulheres:
Aurora, Pilar e Santa. Aurora é uma idosa solitária que é viciada em jogos de
azar, em quais sempre perde tudo e utiliza sonhos surreais para desculpar o seu
vício. Santa, a empregada, sempre pede a ajuda da vizinha dedicada e religiosa,
Pilar, para solucionar os problemas da patroa. Embora convivam com Aurora há
anos, as duas nada sabem do passado desta. No entanto, Aurora já no leito de
morte faz-lhes um pedido: quer um encontro com Gian Luca Ventura. O encontro
não acontece, já que Aurora morre antes que Ventura chegue ao hospital e é a
partir da sua morte que o seu passado vem à tona. Ventura inicia a segunda
parte do filme, Paraíso, na qual conta às duas senhoras a história de amor e
crime que viveu há décadas com Aurora no Monte Tabu, um local belo, exótico e
imaginário situado na África. Essa segunda parte é contada a partir da memória
de Ventura, não contendo diálogos, apenas sons diegéticos. Dessa forma apenas o
narrador e a imagem são os responsáveis por nos informar tudo o que sucede.
Tabu é
essencialmente um filme nostálgico, volta a um cinema simples e imagético e é a
partir dessa simplicidade que Gomes faz com que seu filme se torne grande. É o
tipo de filme que a imagem diz tudo; não é preciso de som, de diálogos ou de
cores para compreendê-lo. A volta a uma África colonial descreve o recontro
entre passado e presente materializando na questão da memória. Assim Miguel
Gomes mostra como o cinema necessita de tão ‘pouco’ para ser maravilhoso.
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