sexta-feira, 9 de julho de 2010

Sexo e Vingança para o Jantar (ou Como Reconhecer um Filme de Greenaway), por Aaron Athias


Não é preciso conhecer toda a filmografia de Peter Greenaway para perceber as suas marcas registradas. Aliás, no meu caso, eu só tinha visto “Afogando em números” de 1988, mas mesmo após ter perdido o começo do filme “The Cook, the Thief, His Wife & Her Lover“ (1989) quando entrei na sala, reconheci facilmente o estilo de Greenaway.

Para começar, a música excêntrica. Novamente em parceria com Michael Nyman, Greenaway optou por uma trilha sonora também bastante parecida com a de “Afogando em Números” - muito estranha e dramática. Além disso, devido à formação artística que teve e sua forte influência barroca e renascentista, Greenaway 'pinta' com a câmera. As grandes sequências horizontais, os close-ups em objetos aliada à uma iluminação singular formam verdadeiros quadros e isso é uma forte característica de Greenaway

Ao tomar posse de um restaurante fino chamado La Hollandaise, o gangster Albert Spica (Michael Ganbom) passá a frequentá-lo toda a noite acompanhado de toda sua 'trupe' e de sua entediada mulher Georgina Spica (Helen Mirren). Mal educado e vulgar, Albert atormenta todos a sua volta com escândalos, agressões e abusos. Com a ajuda dos funcionários do estabelecimento, principalmente do cozinheiro Richard Borst (Richard Bohringer), Georgina consegue levar adiante um romance proibido com um cliente regular do restaurante, o discreto dono de uma loja de livros Michael (Alan Howard). A traição é descoberta e a gangue de Spica mata o Michael de maneira fria e inimaginável.

Para se vingar de seu marido, Georgina conta novamente com a colaboração de Richard e de todas as vítimas de abusos de Spica. A vingança, nas cenas finais, é realizada de maneira magistral e impecável mas também (para não deixar de seguir toda a linha do filme) – bizarra.

É interessante notar como o pecado parece ter sido a matéria prima para elaboração do enredo de Greenaway. Em “O Cozinheiro, O Ladrão, Sua Mulher e seu Amante” são nítidas as referências aos pecados capitais. De cara já observamos a presença da gula com o personagem Albert Spica e sua gangue. Albert janta todo dia em seu restaurante de maneira grotesca e excessiva. Aliás, Spica é a própria personificação do pecado. Além da gula - a ira, a avareza, a preguiça, o orgulho e a luxúria também estão presentes não somente no chefe da quadrilha como em todo o ambiente do restaurante e por consequência em todo longa.

A escolha do figurino (de Jean Paul Gaultier) e sua predileção pelo preto e vermelho tanto na indumentária quanto nos elementos decorativos da mise-en-scène no restaurante não foram ao acaso. As citadas cores tiveram importantíssimo papel no filme na medida em que reforçaram a aura de morbidez e de luxúria presentes na história.

E é dessa forma que durante toda trama prevaleceram esses aspectos absurdos em contraposição com o próprio enredo em si. A constante presença do grotesco, do vulgar e do inimaginável enriquecem de uma maneira bastante atípica e controvertida o que seria mais uma história de adultério recheada de sexo e vingança. Greenaway é certamente o mestre da bizarrice.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

I’ll come back for the honey, por Ingrid Maiany


Desde a primeira cena de “A Taste of Honey”, sabemos que Jo (Rita Tushingham) é uma espécie de Pollyanna da sétima arte. Inquirida por uma amiga do colégio se irá ao baile, ela diz que não pode ir, porque não possui um vestido e terá que se mudar novamente com a mãe. Mas sua melancolia visível não é duradoura. Em instantes, ela se distrai com uma bolha de sabão que faz nascer de suas mãos envoltas de espuma e abre um sorriso.

O filme inteiro é assim. Tony Richardson está cena após cena deixando um gosto de mel no espectador através de uma personagem de grandes olhos escuros que vão fundo na gente. O longa é, para mim, a dramatização de um trecho de um escritor brasileiro que gosto muito – e que cito sempre – que diz assim: “Então, que seja doce. Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim, que seja doce. Quando há sol, e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo; repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante.”

Jo repete isso sete, oito, nove, dez vezes e quantas mais precisarem. Filha de uma mulher pobre e com uma carência enorme de uma presença masculina (Dora Bryan) – de modo que costuma trocar de namorados como quem troca de roupas apenas para não ficar sozinha – Jo desenvolve um humor irônico, sarcástico e, talvez por isso mesmo, encantador. E então entendemos porque o marinheiro negro vivido por Paul Danquah se apaixona pela menina que chega machucada e triste em seu navio. E entendemos porque Jo se apaixona por aquele homem tão diferente dela – em cor e idade – que cuida de seu ferimento como se fora seu pai.

E ambos se entregam a um amor puro, com sexo sob céu estrelado e aliança de ouro. Doçura nos toques, nos sorrisos, nos olhares, nas palavras. Doçura que salva Jo quando sua mãe a abandona para se casar com um homem mais novo. Porque a questão de idades é um tema forte nesse filme de Richardson. Assim como o relacionamento interracial. O diretor faz tudo de forma tão natural que parece nos dizer: “coloquem um torrão de açúcar nessa mesquinhez amarga que é achar que existe bonito e feio, certo e errado, centro e periferia!”. E nós colocamos. Durante todo o filme, repensamos nossos valores, encaramos nossos preconceitos mais velados e concluímos: “como somos umas antas!”

Pois eu estava em minha condição de anta quando a vida veio dilacerar Jo novamente. O marinheiro vai embora com seu navio e deixa a protagonista grávida e sozinha. Mas como é mesmo aquela canção de Bobby Scott e Ric Marlow homônima ao filme? “I will return/ Yes, I will return/ I'll come back/ (he'll come back)/For the honey/ (for the honey)/And you”. Bom, se o marinheiro volta pra Jo como promete, fica em aberto. Ela, contudo, volta para seu mel. E ele vem calçado nos sapatos da moda.

Para se manter, Jo arruma um emprego em uma sapataria. E eis que ela conhece Geoffrey (Murray Melvin). A sintonia entre os dois é imediata, embora o contato seja breve. Mas o destino parece querer da uma mãozinha a mocinha de Richardson. Os dois se reencontram em um desfile cívico e, vendo que o rapaz não tinha para onde ir, Joe a convida a morar com ele.

Nasceria aí uma grande amizade – meio uma relação de mãe e filha. O rapaz, homessexual, cuida da casa enquanto Joe trabalha. Ele é o amparo, o carinho que ela nunca sentiu na personagem de Dora Bryan. E o relacionamento dos dois é a coisa mais bonita do filme – que é lindo em totalidade. A cena da gruta, um novo carpe diem, nos faz refletir sobre a efemeridade, sentimos uma nostalgia do próprio presente e chegamos mesmo a nos questionar “será que é mesmo possível transformar todo limão em limonada?”.

O fato é que Tony Richardson é, na verdade, um romântico. Por trás das questões sociais que aborda, dos bairros proletários com crianças correndo, da mãe ausente, do filho sem pai e da amizade que se aparta, ele quer nos mostrar que a vida sempre pode melhorar – e não o contrário. E nisso o final do filme é antológico.

Desiludida pela ausência do amigo querido, Jo observa os garotos que festejam ao redor de uma fogueira, quando uma menina lhe oferece uma estrelinha. Com aquelas faisquinhas saltitantes nas mãos, a protagonista é “A Pequena Vendedora de Fósforos”, aquecida com a chama da estrelinha na solidão da noite. O plano fecha no fogo de artifício. Luz no fim do túnel? É, Richardson, acho que nem o Ursinho Pooh (que nos meus tempos de criança era Puff) gosta tanto de mel.

domingo, 4 de julho de 2010

Das ruas à pia da cozinha - Realismo social no cinema britânico de 1958 à 1962, por Bruno Alves (parte 3)


– A Kind of Loving de John Schlesinger (62)

O filme começa com um casamento, mas não o do protagonista Vic. Embora as agruras da vida conjugal sejam o tema principal do filme e si o casamento de sua irmã. Um casamento que simboliza a felicidade idealizada daquele ambiente. Um casamento repleto de gente feia (é o que mais tem nestes filmes, me sinto em casa assistindo-os) de vocabulário extremamente limitado que não cansam de comentar, ou melhor, reafirmar trivialidades. É um casamento com um tom extremamente kistch mas com um ar de felicidade contagiante que é ambicionado por nosso protagonista. Ele, para um protagonista que vive na pia de cozinha, até que é extremamente confortável com suas origens. Não existe nele o desejo de ultrapassar os desígnios destinados em seu nascimento e sim a vontade conformante de quem só procura tirar o melhor daquilo tudo.

Vic está de olho em uma jovem e logo, com o uso de artifícios ingênuos, consegue chamar sua atenção. Ele sabe que existe algo de muito errado na relação, afinal perto da sua namorada alterna entre o desejo e o repúdio. O que ele repudia é a personalidade vazia e consumista que ela exibe e o que deseja é o sexo posto como seu objetivo supremo. Até que para uma inglesa ela é passável, nota 6,5. Enfim, Vic trabalha na relação por motivos puramente egoístas e físicos. O envolvimento emocional é nulo.

Mas ela engravida. Vic preso nas fantasias de um casamento como o da sua irmã e escravo das vontades impostas pela sociedade decide seguir o caminho moralmente correto e a pede em casamento. Ela chora, ele lamenta, ambos sabem que é um casamento fadado ao insucesso, mas tem que fazê-lo. Uma breve lua de mel com uma sugestão honrosa à ignorância sexual que estava sempre presente na sociedade britânica e o retorno à terra. Vic vai morar com sua esposa na casa da sogra, velha enjoada que o despreza, enfim, uma sogra.

Algo interessante neste momento do filme é que com uma certa boa vontade de cinéfilo fantasistas é possível encará-lo até como uma continuação de A Room at the Top. Os obstáculos que Vic enfrenta, como a sensação de ser um estrangeiro em sua própria casa e o conflito de personalidades entre ele, pobretão confortável em sua origem e elas, burguesas hipnotizadas pela televisão e que buscam felicidade através do materialismo que ele não tem condições de proporcionar.

No clímax do filme, frustrado pelo casamento infeliz e pelo aborto da esposa, Vic revira a cidade num oferecimento de sua alma à Baco retornando completamente mamado pra casa (pois se tem uma coisa que bêbado não esquece é o caminho pra casa... e o mé. Momento propício para uma piada com fins de alongar este documento: Mussum chega no barman e pergunta: - Tem leite de cabra suíça? - Não. - Tem leite de vaca holandesa? - Não. - Então tem leite de ovelha escocesa? - Também não. - DEUS SABE QUE EU TENTEI! ME PASSA UMA PINGA!) proporcionando um autêntico barraco com muita choradeira, muito vômito e muita sogra evidentemente.

Após muita patada de todos os lados em vez de se divorciar mais uma vez Vic se dobra aos desejos da sociedade. Vai fazer funcionar embora seja MUITO óbvio que deste casamento não vá sair nada. Mas tem seu momento de epifania ao concluir que se mudando com a esposa pra uma moradia qualquer nota e tudo fracassar ao menos eles saberão a quem culpar e o que deu de errado.

Ps: O maior terror de um homem é uma sogra de nome Esperança.

Inclassificável e imprevisível, por Aaron Athias


Há quem diga que o processo de transposição das subjetividades da vida de um realizador ao filme é inerente ao processo metodológico de criação do filme ou que, na verdade, qualquer processo criativo vai carregar as marcas, por mais ínfimas e sutis que sejam, da vida do pensamento de seu criador. Pensei muito sobre esta questão ao pesquisar sobre o filme Cul-de-sac (1966) de Roman Polanski. Das poucas fontes que encontrei, em todas observei a constatação de que a película tinha um forte aspecto autobiográfico no que tange os personagens George (Donald Pleasence) e Teresa (Françoise Dorléac). Antes de entrar mais a fundo nesse ponto, acredito que seja melhor contextualizá-los no enredo.

Encalhado em seu carro roubado, Dickie (Lionel Stander) se vê obrigado a ajudar seu comparsa ferido Albie (Jack MacGowran). Nas redondezas da praia encontra um castelo, aparentemente desocupado, mas que logo prova ser habitado pelo estranho casal George e Teresa. Armado, Dickie começa um jogo de ameaças para conseguir tudo que quer do casal assim como se prepara pra encontrar com seu chefe Katelbach. A visita não acontece, ao invés disso, familiares de George chegam de surpresa ao castelo. Enquanto Dickie, Teresa e George fingem normalidade, Teresa se aproveita da situação para reverter a dominação de Dickie e diz às visitas que o gangster é “o novo mordomo”. Nessa parte do filme, um tanto quanto cômica, destaco a atuação de Lionel Stander fingindo ser o mordomo James. Como num jogo de gato e rato, Dickie novamente volta a aterrorizar o casal com a partida dos visitantes. O clímax se encontra nessa parte final do filme, em que uma brincadeira de Teresa mal interpretada por Dickie, sua reação e a mudança de atitude de George mudam o rumo dos três personagens.

Autocentrado nessa tríade, o filme praticamente escanteia qualquer espécie de relação com o mundo exterior, de modo que os personagens, como a família de George que o visita inesperadamente, são quase que figurantes e secundários, servindo somente para alimentar uma tensão pré-existente entre os principais. Outro exemplo desse 'escanteiamento' é o fato de não ser explicado em nenhum momento os detalhes da missão fracassada de Albie e Dickie. Deduzimos que são criminosos por estarem com um carro roubado e sabemos que Katelbach é seu chefe, mas Polanski faz questão de não ir a fundo nesses detalhes, prevalecendo em toda a trama a relação do trio. Aliás o filme como um todo é um recorte. A vida de todos os presentes existe e termina no período retratado pelo longa. O que veio antes não interessa.

Essa relação entre Teresa, Dickie e George, o foco do filme, é sem dúvida uma das mais estranhas que já vi. De um lado Dickie, o criminoso agressivo e ao mesmo tempo brincalhão que em um primeiro momento aterroriza o casal. Do outro lado, a impetuosa e sensual Teresa passa a história toda reclamando de George, pedindo para que ele tome uma atitude contra Dickie. Percebemos, porém, que ao mesmo tempo em que Teresa odeia a figura de Dickie, paradoxalmente ela também se sente atraída por ele. Isso é claro na cena em que ela vai ajudá-lo a enterrar Albie. Por fim, temos o George, o afeminado e acovardado marido de Teresa, que não percebe o crescente desinteresse em que sua mulher tem alimentado por ele.
Medo, amor, ódio, e amizade se confundem de uma maneira que é impossível prever o desfecho do trio.


E essa imprevisibilidade faz com que Cul-de-sac não se encaixe em nenhum dos arquétipos pré-estabelecidos de gêneros cinematográficos. A oscilação entre suspense, drama e comédia fazem com que críticos e estudiosos consideram o longa de Polanski o mais inclassificável e imprevisível de toda sua filmografia.

Foi o segundo filme de Polanski rodado na Inglaterra com boa parte da equipe de produção sendo inglesa. O orçamento relativamente grande e o espaço para maior liberdade criativa se deu às custas do sucesso de Repulsion, filmado no ano anterior. Gozando de uma autonomia maior no processo criativo, Polanski aproveitou um roteiro de 1963 chamado “When Katelbach Comes” para o novo longa.

O roteiro de Cul-de-Sac é uma história de relações interpessoais claramente inspirado nas obras Samuel Beckett, cujas peças continham casais mal resolvidos, de personalidades opostas e com expectativas individuais divergentes. A relação entre Teresa e George se encaixa perfeitamente nesse quadro. O casamento dos dois apresenta-se frágil e temperamental. E aqui voltamos ao aspecto autobiográfico: o casal George e Teresa são comparados ao próprio Polanski e o breve período em que esteve casado com a atriz polonesa Barbara Kwiatkowska. Muitos dizem que o traço abestalhado e apaixonado de George quando próximo de Teresa é uma característica de Polanski enquanto marido da atriz, que por sua vez também tinha uma personalidade muito similar a de Teresa. Enfim, uma relação instável entre duas pessoas muito diferentes e fadada a findar-se.

Aliás, a instabilidade das relações é, ironicamente é uma das poucas características do filme que perdura do início ao fim. Não somente entre o trio, mas entre o trio e os agentes externos. Consequentemente a tensão entre os personagens é outra constante.

Sabe-se também que o que contribuiu para o clima tenso do filme foi o próprio clima tenso por detrás das câmeras. O perfeccionismo de Polanski teria abalado as relações entre os membros da produção do longa. O diretor não se entendia bem com Stander (Dickie do filme), não gostava do ar “estrela de cinema” de Dorléac e se assustou quando viu Pleasence de cabeça raspada nas vésperas das gravações. Além disso, Polanksi queria filmar tudo de uma vez. A cena em que George conversa bêbado com Dickie na praia foi uma das maiores tomadas de cena na época. Por causa do seu perfeccionismo, Polanski quase matou Dorléac de hipotermia ao querer gravar a cena dela tomando banho nua no mar pela terceira vez. Ironicamente, um ano após as filmagens, Dorléac morre em um acidente automobilístico.

Cul-de-sac, é uma expressão francesa mais ou menos equivalente ao nosso 'beco sem saída'. O filme faz jus ao seu nome durante boa parte do filme, já que George e Teresa se tornam reféns de Dickie. Porém com a inversão de papeis da metade pro fim, tudo se torna confuso. Talvez beco sem saída significa uma prisão figurada onde as relações dos três personagens se encontram, representando assim a convivência forçada entre os três.

Independente do nome que leva e do gênero que ele porventura seja classificado, Cul-de-sac deixa a desejar quanto ao enredo, mas compensa no drama psicológico e na construção dos personagens. Ele é acima de tudo uma história angustiante sobre personalidades excêntricas e suas relações, além de ser carregado de humor negro, ironia e tensão do início ao fim.

"Meu nome é Joe", de Ken Loach, por Débora Freitas Baía


Joe Kavanagh é um ex- alcoólico, que freqüenta o A.A., desempregado e residente da periferia de Glasgow. Ele é treinador do time local, e faz diversos “bicos” para sobreviver. My name is Joe é a frase que abre o filme, mostrando o relato do personagem numa das reuniões dos alcoólicos anônimos. Sarah é assistente social e numa de suas visitas a uma família (Liam e Sabine) do bairro, conhece Joe. Liam e Sabine são ex/usuários de drogas, viciados em heroína, o que fez Liam contraiu grande dívida, mas foi perdoado. Sua esposa, no entanto, não abandona o vício, e faz outra grande dívida, fazendo com que os traficantes ameacem quebrar suas pernas ou colocar sua mulher para se prostituir caso não pague a dívida. Liam é jogador do time de Joe. As histórias se entrelaçam no mesmo bairro.

A periferia da cidade de Glasgow é uma das mais pobres da Escócia e do Reino Unido, por isso mesmo sofre menos os processos de globalização e multiculturalismo que assola os outros países; ela amarga o desemprego estrutural e os índices de violência e vício em drogas, além de doenças de toda a espécie, problemas de saúde típicos de países mais pobres. Esse isolamento, junto ao uso de dialetos que os diferem dos demais bretões, os colocam numa posição anti-inglesa e anti-não europeus.

Esse filme mostra o sentimento de comunidade entre os viventes do mesmo bairro. Apaga-se a noção de identidade nacional a partir do momento em que não há grandes referências locais, apenas o senso de comunidade do bairro, naquela instância fragmentada do bairro. A coisa que promove essa cor local mais aproximada é o futebol. Quando Joe chama seu time de família e toma pra si os problemas de um de seus jogadores, como um pai. As vivências desse bairro também propõem uma reflexão sobre a situação escocesa, pois o país é o mais pobre do Reino Unido e mais acometido de violência e vícios de uma forma geral. A “comunidade global” fica a cargo da anulação das especificidades locais, e mesmo sabendo que o sotaque marca o território, pobreza é um problema global, não resolvido pela globalização, talvez resultado dela, em certa medida.

São personagens aleatórios, perdidos na falta de dinheiro e desemprego, fumantes assíduos e usuários de drogas, com seus próprios líderes locais, eleitos pela força, representado pelos traficantes de drogas. O futebol surge como símbolo de unidade e de amenização das diferenças, solo neutro de divergências saudáveis, a válvula de escape. O cotidiano é marcado com sucessão de cigarros e dramas. Quando Joe assume a dívida de Liam e é encarregado de fazer as entregas para o traficante local, não pensa nas drogas em si, ou seja, como um incentivo ao ciclo vicioso do qual seu amigo foi vítima, pensa apenas em salvar a vida dele. Quando Sarah apresenta esse conflito a partir de suas experiências com as conseqüências das drogas, ele anula seu individualismo para retomar o sentido de cidadania. Uma vez cancelado o trato, não há salvação para Liam, ele comete suicídio. Loach coloca no nascimento do filho de Joe o renascimento do mesmo, e a esperança de renovação.

"O Som e a Fúria ¹", por Marina Paula


Quatro jovens em um palco, entoando os primeiros acordes de “Whatcha gonna do about it?”... Ora, certamente eles estão usando ternos, e logo estarão declamando “Eu quero que você saiba que eu lhe amo, querida. Quero que você saiba que eu me importo”. Estamos nos anos 60, na capital inglesa e estes são os Small Faces. Certo?

Errado. Continuamos em Londres, mas em 1975. Agora, muito mais lixo nas ruas e uma insatisfação cada vez maior por parte da população. Dez anos se passaram desde o lançamento do primeiro single daqueles que foram um dos principais símbolos mod do Reino Unido. Chegava a hora de uma nova geração ganhar sentido. Naquele momento, em um pequeno espaço da Saint Martin’s College, um outro quarteto fazia sua primeira apresentação. Os acordes eram os mesmos, mas as roupas rasgadas e a guitarra completamente distorcida já antecipavam o que os grunhidos de seu vocalista viriam abertamente declarar: “[...] saiba que eu lhe odeio, querida. [...] saiba que eu não me importo”. Agora são a sujeira e a raiva, por muito contida pelos habitantes dos bairros da working class londrina, que invadem também as suas músicas, e será justamente este cenário, determinante para o surgimento dos Sex Pistols e o instante em que começava a se disseminar a cultura punk na Inglaterra, o escolhido para o tema do filme O Lixo e a Fúria (2000).

Tendo sido uma espécie cinegrafista particular dos Pistols no início da carreira, não surpreende que mais este filme sobre eles receba a assinatura de Julien Temple na direção. Vinte anos após o lançamento de The Great Rock ‘n’ Roll Swindle, bastante criticado pelos integrantes, especialmente John Lydon (aka Johnny Rotten), por acharem que o filme apenas retratava a versão do empresário Malcom McLaren sobre a história da banda, lhes é dado o direito de resposta. A partir de imagens de arquivo (boa parte registrada pelo próprio Temple), antigas e recentes entrevistas com os músicos e diversas colagens de cenas retiradas de programas de televisão da época, comerciais, animações, etc., Temple remonta a mesma história contada no filme anterior, agora seguindo a perspectiva dos integrantes.

As declarações de McLaren sobre o assunto dizem que a banda surgira a partir de um novo conceito seu, junto com a designer Vivienne Westwood, de usar as pessoas para expor suas obras de arte. Toda a vestimenta, sonoridade e postura dos Sex Pistols seriam, portanto, um produto da sua criatividade e os garotos, apenas marionetes que ele levaria aonde quer que entendesse. Para confrontar os argumentos da banda com os do empresário, o principal recurso utilizado fora fazer um apanhado histórico do momento vivido pelos então jovens de classe operária antes de formarem a banda (antes da interferência de McLaren), a fim de explicar os motivos que os levavam a certos comportamentos e atitudes pelos quais suas imagens foram imortalizadas.

Entre os discursos ora raivosos, ora emocionados do vocalista John Lydon, somos apresentados à realidade e às agitações de uma Londres caótica que, cada vez mais, caminhava em direção ao conservadorismo da era Tatcher. Além de, obviamente, fazer um apanhado completo sobre a trajetória do grupo, desde a infância de cada um dos integrantes até a turnê americana que marcaria o fim de sua carreira (onde são usadas as imagens do longa de estréia de Lech Kowalski, Dead on Arrival), Julien Temple se preocupará em mostrar como toda a confusão presente na cidade durante os anos do enfraquecimento definitivo do partido trabalhista fora decisiva para determinar a quantidade de sujeira e descontentamento que seriam incorporados pelo som da banda. Será, então, usando as imagens dos conflitos dos trabalhadores, da greve do recolhimento do lixo e de todos os problemas que afligiam o país entre os anos de 1975 e 1978, que o filme conseguirá provar: os grunhidos e desafinos de Johnny Rotten faziam todo o sentido.

1 The Sound and the Fury é o título original de um romance de 1929, escrito por William Faulkner, que sevira de inspiração ao título de uma matéria do jornal The Daily Mirror sobre os Pistols, que, por sua vez, inspirara o título do filme.

Das ruas à pia da cozinha - Realismo social no cinema britânico de 1958 à 1962, por Bruno Alves (parte 2)


Odeio essa mulher (Look Back in Anger) de Tony Richardson (59)

O realismo social tomaria a Inglaterra à partir desta obra de Tony Richardson baseada na seminal peça do mesmo nome de um dos precursores dos jovens irados, John Osbourne.

Se em Room at the Top presenciamos um Joe contido em suas maneiras e focado em um único objetivo, aqui podemos ver o que aconteceria com ele se abdicasse (ou sequer tentasse) de sua ascensão por um casamento. O protagonista aqui é Jimmy. Casado com Allison uma mulher que veio da classe média, vivendo em um apartamento minúsculo, vendendo doces durante as manhãs na feira local e tocando jazz nos bares à noite parece ter sua alma tomada por uma raiva infinita. Sua esposa é constantemente vítima de suas acusações e intempéries despejadas eloquentemente segundo após segundo. Quando esta esconde uma gravidez e traz para casa uma amiga que ele odeia, Helena, o vemos inebriado pelo próprio veneno que injeta através de monólogos cruéis. A sua revolta que inicialmente parecia não ter motivos aparentes advém deste elemento vital do movimento, a insatisfação.

Insatisfação de uma vida repleta de perdas, de oportunidades negadas mas que no entanto lhe permitiu ter a educação necessária para compreender o quanto perdia em cada uma das batalhas. Casou-se com uma mulher que aparentemente ama, embora o espectador possa indagar com completa razão se aquele relacionamento não se sustenta apenas graças à luxúria, que no entanto crê que não o conhece verdadeiramente. É britânica mas sua classe diferente a faz filha de uma cultura completamente diferente.

Tem um único relacionamento satisfatório e saudável: Sua amizade com um imigrante irlandês chamado Cliff que se esforça em manter a paz no casamento do amigo. De temperamento ameno e satisfeito com a vida como ela é parece ser seu completo oposto. Mas a raiva sem limites e muitas vezes inexplicável acaba afastando Allison de si e consequentemente Cliff. O que não parece ser um problema já que ela é prontamente substituída por Helena, repetindo tintim por tintim o que mantinha seu relacionamento anterior funcionando. Helena se demonstra enojada por Jimmy durante boa parte do filme, no entanto basta apenas um avanço para ela ceder. É mais um (para Jimmy) relacionamento calcado em apenas atração sexual que ignora amizades e o bom senso.

No fim Allison perde o bebê. Helena e Cliff vão embora e o casal original se vê reunido mais uma vez em uma estação de trem, com um enquadramento com alusões de romantismo. Mas um romantismo que nasce de um desastre que rebaixa Allison ao nível de Jimmy. Ao afirmar que sabe finalmente o que é a perda de um ente querido ela lhe comunica que enfim eles são iguais. Isso permite-os um reconciliamento e o beijo entre as sombras e fumaças (eita país fumaçento). Mas não é um final feliz. Ambos perderam amizades importantes e entes queridos. Ambos terminam a história mais infelizes que começaram. E sem Cliff e sua função apaziguadora que conseguia manter aquela relação funcionando é um casamento que ainda tem tudo para fracassar.

Life of Brian – a versão pythonesca para nonsense político/religioso anunciador do fim dos tempos, por Milena Wanderley


A falta de sentido para a maioria das coisas na vida parece ser o norte das ações de pesquisa de muitos cientistas e filósofos. Esta questão já moveu pessoas como Nietzsche e Darwin em teorias que explicassem de onde veio o ser humano e qual é o sentido de sua existência , assim também, parece ser conduzida a narrativa cinematográfica do grupo de humor britânico “Monty Python”, que , inicialmente, produziu para a emissora BBC a série “Monty Python's Flying Circus” e ganhou notoriedade em todo mundo difundindo o sentido do verdadeiro humor britânico.

Para os ocidentais no chamado novo mundo, perceber o humor britânico é um exercício de leitura de mundo e perspicácia, e devido ao precário estímulo para sensibilidade de fazer leituras mais profundas, poucos são aqueles capazes de preencher as lacunas que levam ao riso. E é justamente esta falta de gratuidade e intenção crítica audaz, que chama atenção nas comédias nonsense britânicas, e, em particular, nas que foram produzidas pelo grupo já referido.

Aqui, traçar-se-á um comentário mais analítico que crítico acerca do longa “Life of Brian – A vida de Brian”, procurando enunciar as relações discursivas que caracterizam o humor produzido na Inglaterra bem como apontar alguns dos eventos julgados importante no filme em questão. Para tal, far-se-á também presente, neste comentário, comparações com o clássico pós moderno da literatura britânica “O guia do mochileiro das galáxias” de Douglas Adams, um colaborador inconteste do discurso humorístico montypythiano ( se é que este termo existe). O fato é que tanto as séries produzidas pelo grupo, quanto os longas, influenciaram a forma do mundo construir o humor e não é difícil perceber ecos de seu estilo por aí a fora, que o diga o grupo “Casseta e Planeta Urgente” em seus tempos áureos e o sarcasmo crítico de Jorge Furtado em “A ilha das flores”, curta que não só parece ter herdado o apuro analítico e discursivo, como também a técnica de animação preferida do grupo de humorístico criada pelo cartunista Terry Gillian.

Através de uma sátira em torno da história do nascimento de Jesus, “A vida de Brian” monta uma ficção em torno de um personagem que teria sido contemporâneo de Jesus Cristo, tendo nascido no mesmo dia que ele e por isso confundido com o menino santo pelos reis magos. É interessante perceber, que embora o tempo seja muito anterior ao que se vive agora, a consciência das personagens são extremamente atuais, assim os conflitos culturais colocados, mais o exagero cênico , em alguns momentos, tornam as cenas interessantíssimas no que diz respeito a análise de aspectos ligados à religiosidade, pois o discurso religiosos é veementemente simulado durante a narrativa, salvo o respeito resguardado pela figura de Jesus como existe também no início da narrativa de Adams, porque ambos, o escritor referenciado e o filme, consideram ele um cara legal que dizia coisas com sentido. E na cena que Brian e sua mãe tentam ouvir o que Jesus estava dizendo na montanha e que, por estarem muito longe, não ouvem com clareza o que era dito pelo Messias, pode-se perceber o que a má interpretação de algumas palavras fez com a humanidade ao longo do tempo, pois o fato das palavras não serem bem escutadas causa uma confusão entre as pessoas que estão no entorno, pessoas estas que aparecerão crucificadas mais a frente. Tal situação, remete às diversas interpretações acerca das palavras de Jesus e da manipulação dela, o que, na história da humanidade, gerou muitas divergências e guerras.

A cena clássica do filme, e talvez a mais lembrada, é a cena do apedrejamento, evento que, pela tradição judaica, mulheres não podiam participar, mas que aparece retratado como resistência e subversão feminina na época, porque, além do comércio de pedras para a sessão de apedrejamento, ainda havia um comércio de barbas falsas para que elas se passassem por homens, os quais tinham pouco ou nenhum interesse por apedrejamentos. Outro fato que chama bastante atenção em A vida de Brian neste momento da narrativa, é o motivo, pelo qual, um ancião está sendo condenado ao apedrejamento, sendo a razão do apedrejamento ironizada pela sequência de acontecimentos que se seguem, pois ao invés do ancião, o fariseu é que aparece apedrejado no fim da sessão, por repetir o “erro” do condenado: falar o nome de Deus em vão.

Embora as produções montypythianas sejam conhecidas pela referência a imagens e situações surrealistas, como se pode notar claramente no seu outro longa “O sentido da vida”, a narrativa em “A vida de Brian” segue um curso tradicional com início, meio e fim bem marcados, sem muitas interrupções em meio aos acontecimentos, pois aqui parece que a intenção é a desconstrução do ideal cristão, como se a crítica a religiosidade fosse o princípio de uma série de caricaturas que aparecem ao longo do filme. Assim, o gerador de improbabilidades pythonesco, fazendo referência a Adams, parece intencional e audaz no seu plano de criticar e desconstruir alguns setores e movimentos que constituíram e constituem a sociedade ocidental. Desde a rebeldia sem causa dos jovens judeus, até a pomposa libertinagem verbal da nobreza romana, são, neste filme, significados grupos sociais que, embora tenham sido importantíssimos para a construção do mundo como se conhece hoje, não são assim tão razoáveis no que diz respeito à relevância das ideias que defendem, assim como se comportam alguns grupos políticos na atualidade que fazem oposição a absolutamente tudo, porque, neste sentido, a ideologia parece estar pautada em apenas discordar, ser contra, apontar a falha alheia, e , pasmemos, para isso até se estuda hoje em dia. Sobre esta característica, Douglas Adams também apresenta, de forma inteligentemente irônica, uma crítica ao academicismo e a burocratização da arte quando discorre sobre a forma mais penosa de tortura que existe no universo: a recitação de poemas feitas pelos vogons, forma de vida alienígena de aspecto rude que é responsável pela demolição de construções para criação de vias interestelares, e que, no livro, é responsável pela demolição da Terra para a construção de uma via expressa.

Neste fim de século, milênio, senso e outras coisas mais, obras como “A vida de Briam” e “O guia do mochileiro das galáxias” aparecem como uma grande metáfora das inversões de valores que acometeram a humanidade a partir da dominação ideológica engendrada pelas instituições políticas e religiosas que se conhecem e que fizeram presentes nos tempos da indústria e da tecnologia. O fato é que, depois de tantos teoremas e indulgências, o ser humano, essencialmente, continua o mesmo e busca a mesma coisa: ser reconhecido por alguma coisa e ser recompensado por conta dela, não importa o que a coisa seja, nem como ela seja conseguida. E neste sentido, vão-se os valores, as crenças, os desejos que são freados ou alimentados pelas coincidências hereditárias e sociais que caracterizam cada indivíduo perdido nas palavras que quer encontrar para dar sentido a sua interpretação de mundo ou, neste caso, à interpretação da vida de Brian, que se diga de passagem, é relativa assim como qualquer verdade e qualquer coisa que se escreva ou diga acerca das impressões que se tem diante dos fatos sociais, e talvez seja justamente por isso que as produções montypythianas tenham feito tanto sucesso, por preencher aquele não sei o que dentro das pessoas que procura dar um sentido absurdo para as coisas que foram ensinadas, mas que sempre se desconfiou não ser bem daquela forma, talvez aí esteja contido o segredo do riso e do humor britânico de Monty Python.

A concorrência entre os profetas está acirrada, e Brian, que nunca teve a intenção de se tornar um deles, agora é considerado como tal, não importa o que diga, o povo o segue insistentemente pelo cenário árido que remonta a antiga Jerusalém. O mesmo engano que acontecera em seu nascimento, acontece novamente, as pessoas insistem que ele é o Messias, e embora ele o negue com veemência, as pessoas o seguem por todos os lugares, até que amanhecem ao lado de fora da sua casa. Ao acordar, ele é forçado a aparecer por sua mãe, contrariada, e discursa dizendo que aquelas pessoas não devem seguir a ninguém a não ser elas mesmas. A cena é muito bem montada e organizada, pois a multidão age como se fosse uma só pessoa dando o mesmo discurso, o que faz lembrar o termo “massa de manobra” em que muitas pessoas se comportam de forma igual por conta de um processo de dominação e convencimento manipulador utilizado, na maioria das vezes, por instituições políticas e veiculado através da mídia.

Preso, pela segunda vez, e condenado a crucificação, o personagem central é conduzido a uma espécie de fila dos crucificados em que, burocraticamente e cordialmente, um carcereiro conduz os condenados as suas cruzes. Enquanto as pessoas têm ataques de riso por conta dos problemas de dicção do governante romano, o pelotão do que os soldados chamaram de “festa da crucificação” é formado por cerca de trinta homens condenados que servirão de diversão para a massa popular. Contudo, Judith, uma militante da Popular Frente da Judeia, e amante de Brian, aprece e sugere a libertação dele que é acatada pelo governante, contudo pela demora no processo, os guardas chegam tarde demais na prisão e ele é crucificado. Lá, pregado na cruz, seus antigos companheiros de militância leem um manifesto em elogio ao seu gesto de “auto sacrifício” , pois assim foi interpretado por eles, ao saírem, aparece um grupo de guerreiros que fazem oposição a situação política da época e todos, inclusive os soldados, correm; todavia, a esperança de Brian se desfaz quando o grupo anuncia ser o “pelotão suicida” cometendo suicídio em massa bem na frente de sua cruz. Sua mãe ,desgostosa, aparece para lhe mal dizer e Judith para agradecer-lhe o gesto, é quando um companheiro de crucificação, da forma mais inusitada possível, inicia uma canção com teor de autoajuda como se faz nos clássicos desenhos animados da Disney, com direito à melodia assobiada. A canção logo toma conta com companheiros crucificados, e ao invés do filme acabar com uma triste crucificação em massa, todos os condenados aparecem fazendo parte de um singelo coral cantando uma canção que tem como refrão a seguinte frase “sempre olhe para o lado brilhante da vida” .

Os toques surrealistas podem ser percebidos não só neste final, mas em toda transposição de consciência das personagens para um tempo em que, certamente, não se viveriam as situações que foram transpostas para o filme em questão. Não se sabe se Brian, realmente, morreu ou foi salvo por alguém, pois nesta altura do campeonato já foram levantadas tantas questões acerca do valor dado às coisas e as ideias, que “A vida de Brian” tem mais importância do que “A morte de Brian” ou “A paixão de Brian”. Quanto ao fim dos tempos... Não há referência a imagens apocalípticas no filme, elas só constam no título pela intenção esdrúxula de torna-lo mais impactante.

#Alok, por Ingrid Maiany


“Oh! Carol, I'm so love with you”, cantou Neil Sedaka em 1959, seis anos antes de Roman Polanski lançar o esquizofrênico “Repulsa ao Sexo”, considerado um dos melhores filmes de terror psicológico já feito. E foi essa música que me veio à cabeça desde a primeira cena em que Catherine Deneuve apareceu com seu olhar vazio, dando vida à Carol Ledoux, manicure, retraída e tímida. A atriz, no auge de sua beleza, está exuberante no longa. Frágil, delicada e sensual, Carol atrai não só o olhar dos homens que a cercam, como o olhar do público, que, no filme de Polanski, eleva à máxima a condição de voyeur – premissa do cinema.

Assim como Hitchkock em sua “Janela Indiscreta”, Polanski abusa do olho panóptico. O espectador vê não apenas a desintegração da personagem, como acompanha suas alucinações, à medida que elas evoluem. É exatamente o edifício em forma de anel, descrito por Foucault. Um observador que, de onde se encontra, consegue ver o interior e o exterior de uma cela e nenhum ato de seu ocupante escapa ao seu olhar. Pois bem, vemos a Carol bonita, com rosto de anjo, jovem e cheia de possibilidades e a Carol com uma mente deveras perturbada, e (por que não?) um tanto perversa.

“Repulsa ao sexo” é a primeira parte da claustrofóbica trilogia do apartamento – que conta ainda com os filmes “O Bebê de Rosemary” e “O Inquilino”. Como o próprio Polanski afirmou, em sua biografia “Roman”, o filme é um thriller, feito para conseguir gritinhos de mocinhas no cinema e rapazes assustados abraçando-as. Tudo ajudado pela excelente trilha minimalista de Chico Hamilton, que junto ao som constante de água pingando e tic-tacs de relógios, geram na plateia um desconforto contínuo.

A história se passa em Londres, onde Carol divide apartamento com a irmã mais velha, Hélène (Yvonne Founeaux) . No primeiro plano do filme, já se desconfia que há alguma coisa errada com a mocinha. Seu olhar perdido e suas poucas palavras instigam várias vezes a pergunta “Você se sente bem?” pelos personagens que a circundam. Carol não responde. Segue em seu silêncio, seu andar mecânico, seus olhos de vidro, seus tiques nervosos limpando sujeiras imaginárias.

Embora Carol e Hélène conversem muito pouco, nota-se que a irmã é a única que consegue “salvar” Carol de seu estado doentio. E é por isso que ela entra em desespero quando Hélène anuncia que vai viajar para a Itália com o amante, Michael (Ian Hendry). “Por favor, não vá”, clama a protagonista, e nós fazemos coro já prevendo o desastre: “Não vá, não vá”. Mas acontece que Hélène vai. E, uma vez só, Carol fica gradativamente mais surtada.

Em suas primeiras noites sem a irmã, o sexo muda de quarto no apartamento. E, no lugar dos gemidos de Hèléne fazendo sexo com o amante, um operário que certo dia lhe perguntara na rua, em tom jocoso, se Carol queria ver sua furadeira, a possui silenciosamente em sua cama. Realidade, sonho, alucinação?

As cenas de estupros se repetem algumas vezes durante a película. Em todas é representada da mesma maneira: violenta e muda. A incapacidade de Carol, seus olhos de temor, seus gritos abafados pelo silêncio geram uma angústia no telespectador. Angústia também sentida quando a vemos perceber as paredes sem consistência, de onde saem mãos bobas que a agarram e imobilizam. Carol está presa em um abuso sexual constante e não pode se libertar, não sozinha.

À principio, pode-se pensar que Colin, vivido por John Fraser – que a vê passar na rua e se apaixona por seu jeito enigmático – pode ajudá-la a sair de seu mundo horripilante. O rapaz é carinhoso, atencioso, protetor. Contudo, não há espaço para o romance no filme de Polanski. E se, como diz Caio Fernando Abreu, “sem amor, só a loucura”, o que vemos é uma pessoa em decomposição – tal qual o coelho que seria o jantar e vira a única companhia de Carol no apartamento escuro e fora de ordem.

Envolta em sua insanidade, Carol libera instintos assassinos. Certa vez eu li que a loucura provoca paixão ou compaixão. Polanski não abre espaço para que o espectador tenha pena da protagonista. Mesmo quando revela – se revela – os motivos da repulsa que Carol sente pelo sexo, ele o faz sutilmente. De maneira que, de todos os sentimentos que podemos sentir pela mocinha, Polanski faz surgir, talvez, o menos provável diante das atitudes que ela toma. E assim, quando a vi nos braços de Ian Hendry, imóvel como sempre, ao final do longa-metragem, só pude pensar em uma coisa: “don't matter what you do, oh! Carol, i'm still in love with you”.

“Você não vale nada, mas eu gosto de você”, por Ruana Pedrosa


“Você não vale nada, mas eu gosto de você”. Enxerguei esta frase nas entrelinhas de uma cena de Orgulho e Preconceito. O filme adaptado da obra homônima de Jane Austen é o típico romance que faz as mocinhas suspirarem, mas sua história também aprecia problemas enfrentados pela sociedade.

Como criar cinco filhas, na Inglaterra Georgiana com pouco dinheiro sem pensar em empurrá-las para o casamento? A Sr. Bennet (Brenda Blethyn) é a pura demonstração deste reflexo que no filme torna-se extremamente engraçado. Com a chegada de um rapaz solteiro e rico ao condado, cabe a ela tentar com todas as forças casar Jane (Rosamund Pike), sua filha mais bela. Porém no primeiro baile do filme percebe-se logo que o mundo de Orgulho e Preconceito não gira em torno da bela Jane ou do pretendente ruivíssimo Mr. Bingley (Simon Woods). O casal por quem o público feminino suspira é formado pela “tolerável” Elizabeth Bennet (Keira Knightley) e o lindíssimo Mr. Darcy (Mattthew Macfadyen).

Todo um romance se desenrola entre o primeiro casal, enquanto os protagonistas trocam “gentilezas” (para não dizer patadas), durante quase toda a película.Depois de alguns mal-entendidos, Elizabeth passa a odiar Mr. Darcy, jurando nunca dançar, quanto mais se envolver com o rapaz.

Darcy começa a lutar contra seus preconceitos e os da sociedade que os rodeiam, para poder viver uma história de amor com Lizzie. Aí encontro a cena que descrevo no primeiro parágrafo. Numa tarde de chuva o casal se encontra e ele resolve se declarar. Mas ao dizer que estar negando os seus princípios e esquecendo a origem pobre da moça, Darcy joga suas últimas esperanças fora. Seria a mesma coisa de fazer uma serenata com o hit do forró Você Não Vale Nada, Mas Eu Gosto de Você, nos dias de hoje.

Com uma fotografia patriótica com a Inglaterra, mostrando planos belíssimos. Figurinos de época que mesclam entre a simplicidade da família Bennet e o luxo da Srta. Bingley (Kelly Reilly) e de Lady Catherine, numa célebre participação de Jude Dench. A história de Jane Austen é realizada de forma encantadora pelo diretor Joe Wright. Claro que, pessoas anti-romanticas dormiriam durante sua exibição, pois o filme é longo e as grandes emoções demoram a acontecer.

Mas a grande história deste filme são os dilemas da convivência em sociedade. Classe social, idade, honra, valores que podem mudar a existência de uma pessoa. Ao entender as verdades de uma pessoa passa-se a se colocar em seu lugar e aceitar sua companhia. Depois de muitas brigas, regadas pelo orgulho dos dois personagens, Elizabeth e Mr. Darcy encontram seu final feliz.

Mas quem realmente se saiu feliz nesta história foi a Sr. Bennet. Ao empurrar Jane para o matrimônio levou junto mais duas filhas.

Das ruas à pia da cozinha - Realismo social no cinema britânico de 1958 à 1962, por Bruno Alves (parte 1)


Room at the Top de Jack Clayton (58 ou 59 há controvérsias)

Room at the top pode ser classificado como um filme transicional. Enquanto a história de Joe Lampton e seu desejo de subir na vida à todos os custos exibe elementos que seriam reconhecidos nos futuros filmes do movimento ele ainda se atém à caracteristicas típicas do cinema tradicional britânico dos anos 50.

Joe é um contador atormentado pela divisão social que assola a sociedade britânica. Crescido nos cubículos típicos das comunidades pobres britânicas à todo momento lhe são lembradas as diferenças inerentes relativas aos diferentes berços da vida. Nele existe um desejo de ascensão social que pensa em concretizar através de dois atalhos, duas mulheres distintas. Em uma, mais velha e casada, encontra a compreensão e o amor que lhe ajudam a atravessar o dia a dia. Na outra, jovem herdeira inocente, vê as possibilidades de um futuro bem sucedido aonde suas vitórias não são determinadas pela capacidade financeira de sua família. Determinado em seu objetivo seduz ambas com consequências desastrosas.

Seu verdadeiro amor é Alice, que vive em um casamento destruído pelas constantes escapadas amorosas de seu marido. Alice é uma mulher de personalidade que se vê conquistada pelos avanços de Joe durante momentos de fragilidades. Entre eles nasce um amor verdadeiro empatado pelos segredos inerentes à um caso e dos desejos sociais de Joe. Eles pensam em fugir mas a realidade é avassaladora e a ambição de Joe por demais desmedida. Ambos decidem sacrificar suas vidas por causas diferentes; Joe, finalmente encarando a possibilidade concreta do golpe no baú que tanto planejara decide sacrificar uma vida de dificuldades mas feliz pelos encantos do dinheiro. Alice se vê perdida em uma prisão construída meticulosamente pelo seus ex-marido que se recusa a deixá-la. Seu único suporte emocional lhe deixa e assim também sua vontade de viver. A liberdade e a felicidade que tanto ambicionara nunca lhe chegariam. Joga a sua vida fora para a surpresa de um Joe abasbacado com as próprias escolhas erradas que seu sonho o levou a cometer. O filme termina com um casamento, um emergente e uma herdeira rumando à uma aparente vida de felicidade conjugal. Mas os últimos momentos dos filmes nos permitem enxergar um Joe desmascarado pela sua própria culpa, aonde seus olhos no contam tudo.

O protagonista poderia ser considerado um protótipo dos que viriam a seguir. Sua classe baixa não é sinônimo de ignorância e permitem-lhe enxergar o mundo como o é, uma sangrenta luta de classes. Sua reação é mais fria e sistemática que seus herdeiros. Só permite-se expressar-se de verdade em companhia de Alice. Ou não. Em uma cena o vemos gritando com ela “I'm working class and proud of it”. O que poderia soar como um moto deste movimento cinematográfico pela voz de Joe soa como uma desilusão. Nem ele mesmo acredita em si, senão não tentaria tanto escapar de suas condições que supostamente tanto se orgulha. Enquanto veremos nas outras obras os protagonistas agirem de maneira desesperada e emocional, Joe se esforça em manter-se controlado de toda a forma, mantendo a maquiagem de bom moço necessária ao seu enriquecimento.

sábado, 3 de julho de 2010

“Me used to be angry young man…” ?, por Marina Paula



Pompa. Polidez. Disciplina. Reverência. São estas algumas das palavras que nossos conhecimentos sobre certas figuras e produtos ingleses nos fazem mais facilmente vincular aos costumes daquele país. No entanto, não é preciso ir muito longe para encontrar uma quebra com este sentimento de nação imaculada e hegemônica. É exatamente o que se vê quando um cineasta decide confrontar, usando imagens de uma tonalidade realista, o peso da tradição e da rigidez com a força de uma juventude contestadora, que começava, cada vez mais, a ganhar voz e corpo ao redor do mundo; É o que faz A solidão da corrida sem fim, filme de 1963, dirigido por um dos pioneiros da “nova onda” britânica.

Se o formato de uma leva de filmes de caráter inquestionavelmente institucionais ganhara seu lugar nos pátios e salas de aula das escolas inglesas, o filme de Tony Richardson não vai se utilizar de um espaço muito diferente para questionar os mesmos valores da moral britânica outrora festejados em cenários como o de Adeus, Mr. Chips (1939). Para tanto, em vez do colégio interno, o cenário é deslocado para uma casa de ressocialização, onde o papel dos alunos é ocupado por uma horda de jovens irados, vindos, em sua esmagadora maioria, da classe operária e que por necessidade ou rebeldia (que no filme, parecem até indissociáveis) acabaram se envolvendo com a criminalidade.

No reformatório Ruxton Towers, o foco está sobre Colin Smith (Tom Courtenay), o mais velho de uma família inglesa de quatro filhos, preso por roubar uma padaria. Apesar de assumir uma postura subversiva, a figura de Colin não invoca ares de total irresponsabilidade, como poderia parecer. Ao contrário, suas ações parecem sempre extremamente conscientes e jamais são questionadas por qualquer tipo de arrependimento ou “moral cristã”. O personagem assume a postura de quem tem o direito, quase o dever, de praticar tais ações – uma espécie de Robin Hood moderno – na própria cidade de Nottingham, berço da lenda –, mas sem a parte da distribuição dos bens ao fim (o que poderia até ser justificável se usássemos como argumento que ele mesmo é um necessitado).

Assistimos, então, a chegada de Colin ao reformatório e o seu processo de adaptação naquele ambiente. Após os primeiros encontrões com a direção, ele começa a aceitar e a se envolver cada vez mais no cotidiano da prisão. A habilidade para o roubo, segundo o próprio personagem, já era havia muito repassada de pai para filho, sendo o costume de correr da polícia o que mais tarde viria lhe possibilitar uma chance de mudar de vida. É através de uma narrativa não-linear que vamos conhecendo a sua vida anterior.

Mesmo após a morte do pai, quando teoricamente deveria assumir o posto de chefe da família, Colin recusa-se a procurar um emprego por não aceitar desperdiçar o seu suor apenas para a prosperidade dos patrões.

Exatamente por essa insubordinação e fortes tendências comunistas não só do protagonista, mas do discurso do filme em sua totalidade, ele recebe o subtítulo “Rebel with a cause”, indo propositalmente de encontro ao título original do clássico americano, Juventude Transviada (Rebel without a cause, 1955), transformando-o assim, em um exímio representante do que de melhor a postura de seu protagonista, um autêntico “angry young man” poderia nos oferecer, um culto à rebeldia.

"Minha Adorável Lavanderia", por Juliana Ribeiro


Minha Adorável Lavanderia é um filme surpreendente, desde o inicio pela falta de protagonismo de Omar Ali, até o final brusco, apesar de o filme ter sim, terminado no tempo ideal. O filme de Stephen Frears conta a história de Omar, de família paquistanesa, cujo tio um empresário engajado, o contrata inicialmente para lavar carros. Omar nos primeiros momentos do filme mal aparece, de vez em quando balança a cabeça, e raramente abre a boca pra expressar qualquer ato de esperteza. Engana-se o espectador, mas logo se entende pelas ações dele, que ele não passa de um aproveitador, além de um boca grande (não fecha a boca nem antes de apanhar). Logo, Omar passa de limpador de carros à gerente de uma lavanderia, e com dinheiro sujo e a ajuda do melhor amigo Johny consegue modernizar o local, que fica mais parecendo uma boate.

O filme de certa forma contrapõe o trabalho duro com o dinheiro fácil: o pai de Omar não quer que o filho se envolva nos negócios do tio, pois sabe como sãos seus negócios. Ao mesmo tempo não expõe ingleses ou paquistaneses como partes separadas, dos dois lados há honestos e desonestos (mais desonestos do lado da Inglaterra, e mais ricos do lado do Paquistão), dando ao filme um ar punk da Inglaterra como um todo. As luzes, o neon e a música pop da época ajudam a compor o cenário que nada negam um estilo bem anos 80 de ver a vida. O ambiente da lavanderia é tão bem feito que é quase possível sentir o cheiro de sabão. O som das bolhas no início e no final do filme são muito interessantes por que ao mesmo tempo que fecham um período de tempo, não fecham uma ação, e o final fica um meio que “acabou?” preso na garganta, o que não é ruim de fato.

O relacionamento homossexual de Omar e Johny é sem dúvida o ápice. Os olhares picantes sempre trocados deixam uma dúvida no ar, até o ponto do primeiro beijo entre os dois, que aí não tem mais dúvida nenhuma. O relacionamento dos dois sempre em altos e baixos, por conta da ganância, Johny é trapaceiro de nascença, e

Omar na tentativa de fazer parte desse mundo através da nova lavanderia às vezes deixa para trás esse relacionamento, que parece mais em função do interesse. Além de tudo a comédia é divertidíssima. A cena de Omar com sua cara de sonso ouvindo seu e tio e sua amante fazerem sexo é impagável. E é claro essa resenha termina como o filme assim: cri, cri, cri

"Minha Adorável Lavanderia", por Ruana Pedrosa


Ano passado tive o privilégio de conhecer O Medo Devora a Alma do diretor alemão Fassbinder. Um filme que descreve preconceitos enfrentados por um imigrante na Europa e com seu relacionamento com uma mulher mais velha. Lembrei desse filme quando parei para assistir Minha Adorável Lavanderia de Stephen Frears.

O título parece ridículo, o barulho de bolha de sabão estourando, no início e fim da película é cômico, mas o resultado é muito bom.

Omar (Gordon Warnecke), rapaz de origem paquistanesa, convive com o preconceito dos dois lados da sociedade. Os ingleses não o respeitam por ele ser imigrante, e sua família por ele ser “quase” inglês. O ambicioso rapaz encontra na lavanderia falida do tio a chance de crescer financeiramente no mundo britânico. Nela também seu amigo de infância Johnny (Daniel Day- Lewis) busca mudar a vida. O inglês é um ex punk fascista, que começa a sofrer preconceitos por parte dos seus antigos amigos que não aceitam sua amizade com Omar. E para complicar ainda mais as relações em sociedade, os rapazes se envolvem amorosamente.

Porém este não é o ponto chave do filme, pois em nenhum momento os outros personagens descobrem a paixão dos protagonistas. É realmente a ambição de Omar e a xenofobia dos dois povos que chama atenção.

Como roteiro inteligente, que chegou a ser indicado ao Oscar no ano de 1986, de Hanif Kureishi, expõe o determinismo em todos os grupos do filme. Em certa cena, por exemplo, um punk fala que os imigrantes vieram para trabalhar para os ingleses e que não poderiam fugir desta realidade.

O filme que vive os anos 80 de maneira completa. Na forma como é filmado, nos figurinos, na trilha musical, nos penteados e no modo de viver, sendo outra obra que relata o problema de minorias.

Destacando a interpretação do casal protagonista. Johnny é o típico marginal apaixonante, chegando a roubar a atenção de Tânia (Rita Wolf), prima de Omar.

Minha Adorável Lavanderia é a maior prova contra o próprio determinismo imposto no início do filme. Omar, bom moço, torna-se ganancioso, não se importando com a as pessoas ao seu redor. Johnny, bagunceiro, com um passado negro, chega a extremos para defender e viver seu amor. Assim a película consolida que não existem pessoas boas ou más, existem pessoas.

Drama e comédia em Mike Leigh, por Thiago Rocha Ferreira




Um grande diretor autoral é reconhecido pelos seus espectadores como alguém que produz filmes na mesma linha, sobre o mesmo tema. No caso de Mike Leigh, há um certo pessimismo que ronda seus filmes, mas que é trabalhado de maneiras diferentes como Naked de 1993 e Simplesmente Feliz de 2008.

Esses filmes trazem um caso curioso de um personagem que aparece mais jovem num filme e reaparece mais velho em outro. É o caso de Johnny (David Thewlis) que faz uma vagabundo solitário e perturbado e que fala constantemente em fim do mundo e em 666, o numero da besta. Esse mesmo discurso reaparece com Scott (Eddie Marsan), um excêntrico instrutor de auto-escola cheio de neuroses. A real diferença entre os dois está na abordagem dos respectivos filmes.

No primeiro, o tom é sombrio: a coloração do filme é azul, as ruas de Londres são sujas, repletas de personagens de rua, usam-se roupas pretas. Situações de violência, principalmente sexual, são exploradas de forma crua, às vezes com o recurso da câmera na mão. Em meio a isso surge uma amizade entre Johnny e um porteiro de um edifício. Conversando, descobre-se que são pessoas com visão de mundo e vidas bem diferentes. O porteiro adota uma posição mais conservadora, aceita seu destino. Johnny prefere uma atitude mais cínica e niilista. A frieza da sua conversa sobre a proximidade do fim do mundo soa não só dramática como apocalíptica. No outro, tudo muda. Aqui ele se vale de uma espécie de humor sarcástico tipicamente inglês, tratando do amargo com tons mais adocicados. Podemos ver essa abordagem em outros filmes britânicos como Um Gosto de Mel (1961) de Tony Richardson. As cores são vivas, o sol é constante, o clima é alegre, divertido. Mas esse mundo reflete o ponto de vista da personagem principal do filme, Poppy (Sally Hawkins), a forma com ela vê as coisas. Scott, contratado pela protagonista para aprender a dirigir, aparece como o seu maior contraponto. Mas um contraponto que de tão mal humorado e nuvioso, soa bem engraçado. Já Poppy, de tão simpática e alegre que chega a ser irritante.

São quinze anos que separam os dois filmes, mas se Leigh insiste nessa personagem é porque é realmente significante para ele. Mas o que fica é a admirável capacidade de velar o discurso, transitando em diferentes estilos.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

"Pink Floyd - The Wall', por Juliana Ribeiro e Ruana Pedrosa


Como se editava filmes em 1982? Esta dúvida começou a pairar sobre nossas cabeças ao assistir o filme de Alan Parker. O musical estrelado pelas músicas do álbum The Wall da banda Pink Floyd, retrata o sentimento de uma época que combatia as normas da sociedade. O filme, com mesclas de animação bem empregadas, narra não linearmente a trajetória de vida de um rapaz, Pink Floyd. Por causa da guerra perde seu pai ainda criança, e desde então tem dificuldades para se ajustar a superproteção da mãe, o que se reflete em todos seus relacionamentos posteriores. Na escola era perseguido pelo professor, refletindo no filme a visão contra o tipo de educação da época, fechada e manipuladora. Ao crescer ele se torna uma estrela do rock, mas todos os seus problemas da infância passam a refletir em sua vida pessoal e profissional.

Tenta cometer suicídio, mutila-se, deteriora-se por dentro e subjetivamente por fora. A montagem não linear e a musicalidade das ações são definitivamente os pontos mais interessantes do filme. Quase todas as cenas são intercaladas com imagens de diversas fases da vida de Pink, como por exemplos analogias diretas à doença na infância e na fase adulta. Uma edição tão bem trabalhada, que é digna de ser questionada em relação à tecnologia da época, pois muitos filmes recentes nem se comparam em competência.

O inteligente roteiro de Roger Walters, que era o vocalista e baixista da banda na época, é bem adaptado para o cinema, apesar do próprio Walter não ter gostado do resultado final. O filme ganha proporções acima do esperado tanto em público como em crítica, tornando-se quase um hino da juventude dos anos 80

"A companhia dos lobos (The company of Wolves)", por Ramon Dias


“Um lobo pode ser mais do que aparenta. Ele usa muitos disfarces. (...) Os piores lobos são peludos por dentro. E quando eles te mordem, eles te arrastam para o inferno”


Uma das mais famosas fábulas infantis é subvertida e acrescida de muito simbolismo e sensualidade nesse clássico do cinema de fantasia. A companhia dos lobos, filme dirigido por Neil Jordan em 1984, faz uma espécie de paráfrase do conto de Chapeuzinho Vermelho, aqui revisto como uma alegoria ao amadurecimento feminino, a transição da puberdade para a vida adulta e a descoberta da sexualidade, além de flertar com o gênero de filmes de terror e com o mito do lobisomem.


Adaptado do romance de Angela Carter, A companhia dos lobos nos coloca dentro do sonho de Rosaleen (a esquecida Sarah Patterson), uma típica adolescente prestes a entrar no mundo adulto, que usa às escondidas a maquiagem da irmã mais velha, divide seu quarto com diversas bonecas e bichos de pelúcia e lê histórias de terror. Em seu sonho, Rosaleen acaba de perder sua irmã (Georgia Slowe), vítima dos lobos que habitam a floresta próxima a pequena vila em que vive. Após a tragédia, a bela jovem passa seus dias entre os afazeres cotidianos, as incontáveis investidas de um garoto narigudo e ocasionais visitas à sua avó (Angela Lansbury). A cada visita, sua avó lhe conta histórias sobre lobos e homens cujas sobrancelhas se unem, enquanto confecciona uma capa de lã vermelha. Até que um dia, a caminho da casa da avó para levar-lhe uma cesta de comida, Rosaleen encontra um jovem cavalheiro misterioso e de sobrancelhas ligadas (Micha Bergese), e que aposta que consegue chegar ao destino antes da moça, pois ele segue um caminho mais curto enquanto ela recusa-se a sair da estrada. Os que conhecem a fábula já fazem uma idéia do que acontecerá em seguida. No entanto, o final guarda uma maliciosa surpresa.

Todo o filme é permeado por uma atmosfera onírica. O cenário, exagerado e de cores fortes, é visivelmente artificial, o que acentua a impressão de irrealidade. Até as poucas cenas que se passam fora do mundo dos sonhos são dotadas de um certo misticismo, como o casarão de estilo vitoriano onde mora Rosaleen ou os enigmáticos bonecos em seu quarto. A trilha sonora, misto do saudoso sintetizador com tons renascentistas, também ajuda na construção de um ambiente híbrido entre realidade e imaginação, que apesar de inicialmente definidas, essa separação torna-se cada vez mais nebulosa, ao ponto de fundirem-se em uma só.

São inúmeras as referências a passagem feminina da infância à maturidade e suas descobertas, a começar pela própria conotação dada à história dos Grimm. Chapeuzinho Vermelho (quer dizer, Rosaleen) é na verdade uma bela adolescente que começa a despertar sua curiosidade em relação ao sexo oposto, assim como os questionamentos acerca da sexualidade. Sua avó passa então a instruí-la, ao seu modo conservador, sobre os homens e os perigos que eles representam. As histórias contadas por ela são ricas em metáforas e alusões, todas possuindo um rígido sentido moral, assim como a fábula a que o filme se refere. Há sempre a idéia do caminho certo a seguir, do qual desviar-se levará a perdição (com toda a ambigüidade que o termo represente), assim como da semelhança entre homens e lobos. Os homens são feras ardilosas, que esperam apenas um deslize para devorá-las. Como a própria avó dirá, “Eles são bons até envolverem você. Mas quando a juventude passa...a besta aparece”. Em contraponto, a mãe parece ter uma visão mais aberta, repreendendo a avó por encher a cabeça de sua filha de abobrinhas, e que fica evidente em sua frase “se há uma fera nos homens, há também nas mulheres”. Mais de dez anos mais tarde, o tema da adolescência feminina seria mais uma vez representado junto com a maldição do lobisomem, no filme Possuída (Ginger Snaps, 2000). Mas enquanto no filme do canadense John Fawcett a abordagem é mais teen, onde as transformações corporais causadas pela puberdade são misturadas com a licantropia (desenvolvimento do corpo, pelos crescendo em lugares estranhos e até a menstruação, referida no filme pelo trocadilho em inglês curse), A companhia dos lobos da um enfoque mais poético, infantil e sensual.

O filme também apresenta passagens que remetem ao surrealismo (movimento enraizado nos sonhos e no inconsciente), como o momento onde Rosaleen encontra um ninho de cegonha, e dos ovos que eclodem surgem pequenas figuras de crianças (talvez uma alegoria à questão “de onde surgem os bebês?”) ou na morte da vovó, quando sua cabeça se espatifa em vários pedaços como uma boca velha de porcelana, além de elementos que o aproxima do cinema de horror. A transformação do lobisomem pode até parecer engraçada aos olhos de hoje em dia cujo padrão de qualidade é Avatar, mas ver um homem arrancar a pele do rosto e do corpo até só sobrar músculos, para em seguida contorcer-se em gritos ao ver seu corpo se desdobrar e adquirir a forma de um lobo pode ter causado algum impacto na época, além da significação intrínseca (o lobo sai das entranhas do próprio homem). E para os mais saudosistas dos animatronics oitentistas, o momento pode até provocar uma certa nostalgia.

Neil Jordan só voltaria ao mundo dos monstros e do sobrenatural ao realizar Entrevista com o Vampiro (Interview with the Vampire) em 1994, filme até hoje considerado um dos melhores do gênero, mas até lá ele já havia consolidado seu nome nesta obra que recria o imaginário (macabro) das histórias infantis, onde Chapeuzinho Vermelho não é tão inocente quanto parece, e o Lobo Mau e o Caçador são um só.

"A Mulher do Tenente Francês (Karel Reisz, 1981)", por Igor Calado


O livro A Mulher do Tenente Francês teve que percorrer um tortuoso caminho para chegar às telas. Mas, ao finalmente fazê-lo, conseguiu reunir nomes de grande peso: o roteirista Harold Pinter, o diretor Karel Reisz e os atores Meryl Streep e Jeremy Irons. Além do próprio autor, o renomado escritor inglês John Robert Fowles.

A proposta, metalingüística, é relativamente simples: os atores Anna (Meryl Streep) e Mike (Jeremy Irons) vivem um affair durante a filmagem de um filme (presumivelmente o próprio A Mulher do Tenente Francês). No filme, os dois interpretam outro conturbado par romântico: Charles Smithson e Sarah Woodruf, em meado do século XIX – ele um pesquisador de fósseis que acaba de se tornar noivo e ela uma empregada conhecida na pequena cidade moralista e vitoriana como uma mulher amoral (por um antigo caso que teve), além de apresentar sintomas psicóticos. O espectador acompanha então o desenrolar de ambos casos de amor, que guardam semelhanças e diferenças entre si.

O livro A Mulher do Tenente Francês é uma importante obra da literatura inglesa e terceiro livro de seu autor, John Fowles – considerado um dos melhores escritores ingleses do século XX e que alcançou grande sucesso desde seu primeiro trabalho, The Collector. No livro, existe apenas a história de Charles e Sarah, mas o autor deixa claro que se posiciona no século XX.

Ousado em forma e conteúdo, a obra de Fowles brinca com as camadas narrativas e questiona o papel do autor, criando mais de um final a ser escolhido. Além disso, como narrador, comenta com freqüência sobre seus personagens e sobre a sociedade vitoriana, sem esconder sua perspectiva do século XX. Assim, acumula ainda a função de crítica do romance vitoriano – Fowles era professor de Literatura Inglesa –, além da de obra literária contemporânea. Essa metalinguagem essencial do livro o tornou uma obra bastante difícil de adaptar.

A saída engenhosa encontrada por Harold Pinter, bastante cinematográfica, foi usar a metalinguagem literária presente no livro e transformá-la num “filme dentro do filme”, a filmagem de um roteiro de época. Assim, Pinter conseguiu manter as relações entre criação e realidade e possibilitar, através de duas linhas narrativas, a existência de dois finais para os dois diferentes casos de amor – mantendo ainda o final aberto do livro. E, também importante, conseguiu manter a visão contemporânea sobre a obra vitoriana.

Muitos foram abordados para trabalhar na versão filmada do livro, a qual Fowles estava interessado em fazer desde sua publicação. Pinter era a escolha de Fowles para roteirista desde o começo; para diretor, muitos nomes foram abordados, como Sidney Lumet e Fred Zinnemann, e mesmo o próprio Reisz, mas recusaram por variados motivos, até que os produtores conseguiram juntar Harold e Karel no projeto e autor deu luz verde para o filme caminhasse.

A presença de Pinter não passa despercebida. Os diálogos possuem forte presença de subtexto e analogia e de falas repetidas seguidamente. Outra idiossincrasia pinteriana existente no filme são as explicações redundantes nos diálogos (“Ela é um amor – a esposa”). A história moderna, que não está presente no livro, é o que há de mais pinteresco, em forma e tema: o adultério, por exemplo, foi o tema principal de sua peça Betrayal (1978) e os diálogos, nessa camada narrativa, são ainda mais próprios do roteirista.

As atuações também lembram as obras de Pinter, que abusa da linguagem corporal e da expressão. Entretanto, neste filme, as expressões faciais são menos trabalhadas e semantizantes do que em O Criado (1963) e O Mensageiro (1970), por exemplo – roteiros de Pinter filmados pelo diretor Joseph Losey. Aparentemente, Losey trabalhava mais as micro-expressões faciais, valorizando as nuanças do texto de Pinter mais do que fez Reisz.

A linda trilha sonora de Carl Davis ganhou o prêmio Anthony Asquith de Música no BAFTA; Meryl Streep ganhou melhor atriz no BAFTA e no Globo de Ouro e foi indicada ao Oscar; Harold Pinter também foi indicado ao Globo de Ouro e ao Oscar. E apesar de não levar nenhum prêmio da festa americana, foi indicado em mais cinco categorias. A fotografia do filme (à cargo de Freddie Francis, que trabalhou muitas vezes com David Lynch), apesar de não ser necessariamente ruim, não me parecia à altura do nível artístico ao qual o filme se propunha. A decupagem era tradicional e bem datada, o que ficou mais óbvio com o uso recorrente de close-ups em zooms rápidos; é tecnicamente correta, mas vazia de qualquer criatividade. O resultado foi uma direção bastante inexpressiva, apesar da recriação estética da época vitoriana ter sido lembrada nos prêmio.

Tematicamente, o filme discorre sobre a narrativa em si e sobre as relações sociais e principalmente amorosas na Inglaterra vitoriana e naquela da década de 70, através do contraste dos dois casos de amor e seus conflitos. Aborda o tema do adultério e da natureza do casamento e das ligações amorosas, além da liberdade sexual e das convenções sociais.

Sarah é uma personagem misteriosa que, ao mesmo tempo que é vítima da rígida moral de sua época e da conservadora cidade onde mora, é inteligente e se utiliza desses mesmos julgamentos para manipular. Anna é uma personagem igualmente ambígua: mantém um relacionamento com seu par romântico no filme apesar de ser casada, e se esquiva (bem como Sarah) de confirmar um relacionamento mais profundo com seu amante.

Durante uma conversa com Charles, seu amigo psiquiatra cita estudos de um suposto médico alemão chamado Hartmann, que, curiosamente, são bastante psicanalíticos – apesar da psicanálise só começar a surgir com as publicações de Freud na década de 80 do século XIX, e a história vitoriana se passar nas décadas de 50 e 60. Essas citações não são em vão, e participam do comentário do texto sobre as diferenças comportamentais entre o dois períodos distantes mais de 100 anos: enquanto Sarah desenvolve comportamentos psicóticos, Anna parece ser alheia.

Nos estudos de Freud, a repressão dos impulsos sexuais era um tema central e, por vezes, relacionado com desordens psicológicas, as neuroses – o que causou furor na sociedade européia conservadora do final do século. Boa parte do comportamento “estranho” de Sarah é tipicamente neurótico.

Já a apatia de Anna, sua insatisfação e esquiva de relacionamentos, além de sua liberdade
sexual, são típicos da sociedade moderna, marcada, a partir principalmente da década de 40, por uma progressiva liberdade dos prazeres que levou a um certo hedonismo social, uma incitação pela busca do prazer (não necessariamente sexual). Muitas vezes, essa incitação social não cai bem a determinados indivíduos, o que resulta no que poderia ser considerado, nesse sentido, o oposto das neuroses repressoras: a depressão. Isso explica o fato dessa doença ter se tornado mais comum à medida que avançava o século XX, virando uma maladia tipicamente contemporânea.

É importante ainda ressaltar o papel da arte como libertador de Sarah. A personagem, que apresenta talento avançado para o desenho, demonstrado através de seus esboços de faces contorcidas e auto-retratos lúgubres, só encontra a cura da “loucura” que sentia quando é abrigada por um arquiteto e passa a dedicar-se a sua própria arte - e seus desenhos tornam-se bem menos fúnebres.

Em conclusão, A Mulher do Tenente Francês passa como uma adaptação astuta do romance homônimo, que apesar de não ter uma qualidade técnica suficientemente à altura do livro e do roteiro, é uma inteligente digressão sobre narrativa, arte, criação e as sociedades vitoriana e contemporânea.