À primeira vista, “Tudo que o céu permite” (1955), do diretor alemão Douglas Sirk, pode parecer mais um daqueles melodramas voltados para o público feminino norte-americano, ansioso pelo próximo tearjerker arrebatador (filmes feitos “pra chorar”). Os estúdios Universal procuraram repetir a fórmula que havia dado certo no filme “Sublime Obsessão (‘Magnificent Obsession’, 1954)”, ao unir os atores Rock Hudson - galã incontestável da época, responsável por arrancar suspiros de mocinhas dos cinco aos quinhentos anos – e da ganhadora do Oscar, Jane Wyman. Correspondia bem à velha fórmula hollywoodiana, uma dupla sintonizada, Hudson interpretando o papel de um dos protagonistas e uma história aparentemente clichê que com certeza iria agradar grande parte do público e da crítica da época.
O filme conta a história de Cary, viúva da classe média alta norte-americana, que passa a maior parte do seu tempo participando ativamente da vida social do country club da cidade, ouvindo as fofocas de suas colegas ou escapando às investidas do inconveniente Harvey. Tudo isso muda quando o jardineiro de sua casa, Ron Kirby, começa a cortejá-la. A história já é conhecida: ambos se apaixonam perdidamente e Cary finalmente sente o vazio de sua vida ser preenchido por um novo amor. As duas realidades se chocam quando Ron pede-a que se mude para sua casa, para que possam então viver juntos. Ron havia largado a profissão de jardineiro para se dedicar ao plantio de árvores na fazenda herdada da família. A partir de então todo o drama se desenrola: pela diferença de classes e idades, ela não sabe se está preparada para contar aos dois filhos – e não sabe se poderá contar com eles –, e ao seu ciclo de “amigos”, abrindo mão de tudo em troca da felicidade de um novo amor.
Aí está o toque da genialidade de Sirk. O meio no qual Cary se insere, representa claramente a mentalidade da sociedade burguesa norte-americana vigente. Sirk teve liberdade para produzir o seu filme, porém, com o que lhe estava disponível. A censura não permitia que tão duras críticas pudessem partir de um filme que, muito provavelmente, seria um sucesso de público. Por isso Sirk se utiliza de diversas metáforas para inseri-las. A mais marcante delas com certeza se trata da brilhante seqüencia na qual Cary está na sala de estar em casa desabafando com Kay, sua filha. Está extremamente infeliz, pois havia terminado com Ron para agradar aos filhos e amigos que consideravam inadmissível o fato de uma mulher de sua idade e de sua “classe” se relacionar com um homem mais jovem e mais pobre. Seu filho surge em casa trazendo um presente de reconciliação: uma televisão, afirmando que ali se encontrava uma “janela para o mundo” e uma companhia, agora que ambos os filhos estavam indo embora de casa, deixando-a sozinha. A câmera então se aproxima da TV, mostrando o reflexo de Cary, sozinha, sentada ao sofá, numa analogia clara à solidão e ao seu estado de espírito, aprisionado diante das aparências. Ora, década de 50. Sabendo que a televisão estava apenas começando a se instalar nos lares das famílias norte-americanas, foi uma atitude extremamente ousada da parte de Sirk ao inseri-la representando a solidão e o vazio da classe média, a superficialidade dos relacionamentos, a ausência de sentimentos permeando as relações humanas. Há uma leve relação com Almodóvar (fã declarado do diretor) durante o filme, provavelmente pelo uso excessivo das cores quentes – decorrente da tecnologia technicolor, marca registrada dos filmes de Sirk – e de suas críticas sociais.
“Tudo que o céu permite” foi bastante elogiado pela crítica da época, sendo considerado um excelente melodrama, com a boa e velha previsibilidade de parte dos filmes hollywoodianos da década de 50. Porém, com o passar dos anos e com as diferentes fases da crítica cinematográfica, foram analisados diferentes aspectos de sua natureza. Entre eles, o duro ataque à moral hipócrita estadunidense que, entre tantos preconceitos, ridicularizava os relacionamentos amorosos entre pessoas de classes sociais diferentes (e com uma considerável diferença de idade, como é o caso de nossos protagonistas). Ao mesmo tempo, Sirk abrange em seu discurso todas as “minorias” que de uma forma ou de outra se identificaram com o dilema de Cary: negros, muçulmanos, homossexuais e (principalmente, por que não?) as mulheres.
O filme conta a história de Cary, viúva da classe média alta norte-americana, que passa a maior parte do seu tempo participando ativamente da vida social do country club da cidade, ouvindo as fofocas de suas colegas ou escapando às investidas do inconveniente Harvey. Tudo isso muda quando o jardineiro de sua casa, Ron Kirby, começa a cortejá-la. A história já é conhecida: ambos se apaixonam perdidamente e Cary finalmente sente o vazio de sua vida ser preenchido por um novo amor. As duas realidades se chocam quando Ron pede-a que se mude para sua casa, para que possam então viver juntos. Ron havia largado a profissão de jardineiro para se dedicar ao plantio de árvores na fazenda herdada da família. A partir de então todo o drama se desenrola: pela diferença de classes e idades, ela não sabe se está preparada para contar aos dois filhos – e não sabe se poderá contar com eles –, e ao seu ciclo de “amigos”, abrindo mão de tudo em troca da felicidade de um novo amor.
Aí está o toque da genialidade de Sirk. O meio no qual Cary se insere, representa claramente a mentalidade da sociedade burguesa norte-americana vigente. Sirk teve liberdade para produzir o seu filme, porém, com o que lhe estava disponível. A censura não permitia que tão duras críticas pudessem partir de um filme que, muito provavelmente, seria um sucesso de público. Por isso Sirk se utiliza de diversas metáforas para inseri-las. A mais marcante delas com certeza se trata da brilhante seqüencia na qual Cary está na sala de estar em casa desabafando com Kay, sua filha. Está extremamente infeliz, pois havia terminado com Ron para agradar aos filhos e amigos que consideravam inadmissível o fato de uma mulher de sua idade e de sua “classe” se relacionar com um homem mais jovem e mais pobre. Seu filho surge em casa trazendo um presente de reconciliação: uma televisão, afirmando que ali se encontrava uma “janela para o mundo” e uma companhia, agora que ambos os filhos estavam indo embora de casa, deixando-a sozinha. A câmera então se aproxima da TV, mostrando o reflexo de Cary, sozinha, sentada ao sofá, numa analogia clara à solidão e ao seu estado de espírito, aprisionado diante das aparências. Ora, década de 50. Sabendo que a televisão estava apenas começando a se instalar nos lares das famílias norte-americanas, foi uma atitude extremamente ousada da parte de Sirk ao inseri-la representando a solidão e o vazio da classe média, a superficialidade dos relacionamentos, a ausência de sentimentos permeando as relações humanas. Há uma leve relação com Almodóvar (fã declarado do diretor) durante o filme, provavelmente pelo uso excessivo das cores quentes – decorrente da tecnologia technicolor, marca registrada dos filmes de Sirk – e de suas críticas sociais.
“Tudo que o céu permite” foi bastante elogiado pela crítica da época, sendo considerado um excelente melodrama, com a boa e velha previsibilidade de parte dos filmes hollywoodianos da década de 50. Porém, com o passar dos anos e com as diferentes fases da crítica cinematográfica, foram analisados diferentes aspectos de sua natureza. Entre eles, o duro ataque à moral hipócrita estadunidense que, entre tantos preconceitos, ridicularizava os relacionamentos amorosos entre pessoas de classes sociais diferentes (e com uma considerável diferença de idade, como é o caso de nossos protagonistas). Ao mesmo tempo, Sirk abrange em seu discurso todas as “minorias” que de uma forma ou de outra se identificaram com o dilema de Cary: negros, muçulmanos, homossexuais e (principalmente, por que não?) as mulheres.
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