sexta-feira, 30 de novembro de 2007

"A história de um amor que se viveu sozinho" por Paulo C. S. de Azevedo


O filme todo parece um fluxo de consciência, talvez essa impressão fique tão marcante por causa da narração do personagem principal durante toda a história. Além do narrador, existem apenas mais dois personagens relevantes: a mulher, à qual o narrador faz referência constante; e o seu acompanhante no hotel no qual a história se passa.

Os cenários são sempre muito bonitos, grandes salões, jardins, sacadas, corredores. As pessoas também são elegantes, elegância apropriada à festa onde estão. No entanto, a festa que é vista no filme não parece acontecer. Os sons que uma festa normal teria, a música da banda, ou até mesmo as conversas das pessoas, tudo se passa em silêncio, sem nenhum som. Ou pelo menos sem nenhum som diretamente ligado à imagem, já que a música da banda às vezes aparece como parte da trilha sonora, por mais que ela não esteja presente.

A impressão que se tem é que as pessoas do filme, fora, obviamente, os três personagens principais, fazem parte apenas da composição da imagem, quase como se fossem elementos cenográficos. Seus diálogos, suas ações, nada parece ter relevância na história.
História essa que, do meu ponto de vista, é retratada exatamente como quando nós nos lembramos de um amor do passado. Nós provavelmente não lembramos das pessoas que estavam na festa, nem dos assuntos sobre os quais falavam, mas sabemos o que falamos com quem amávamos no momento. É isso que o filme retrata, e retrata do mesmo jeito que a lembrança, com diálogos confusos, repetidos e organizados de uma forma não-linear. Só são retratadas as cenas, os diálogos e os sons que foram importantes para o personagem principal.
Os diálogos fazem referência ao ano anterior ao qual se passa a história. O narrador insiste que encontrou-se com a mulher nesse determinado ano, e que ela lhe pediu para que esperasse por mais um outro. No entanto, a mulher não parece lembrar-se do narrador no princípio do filme, por mais que sua postura vá mudando ao longo da história.

Esse é um outro indício do fluxo de consciência retratado no filme, onde o personagem principal tem problemas em relatar o que realmente aconteceu, já que, como na maioria das paixões antigas, é difícil de separar o que aconteceu dos desejos sobre o que deveria ter acontecido. Como quando, antes de deitar, ficamos nos perguntando o que poderíamos ter feito de diferente, ou o que poderia ter acontecido diferente.
Além das declarações do narrador, fica clara a paixão que ele sentia também através das imagens. O figurino e a maquiagem da mulher são sempre mais marcantes do que os das outras personagens. Sem contar que não são figurinos comuns, são sempre mais extravagantes e com cortes diferentes; a atenção dada, não só pelo narrador, mas por todos os personagens, em relação à mulher é diferente das outras mulheres da festa. Como se ela fosse a única que importasse.
No fim das contas, se trata, mesmo, de uma história de amor. A história em si não é muito
diferente dos amores hollyoodianos, nem o filme, visualmente falando. A real diferença entre O Ano Passado em Marienbad e os outros filmes de amor é a forma que a história é contada, sob a ótica exclusiva do personagem principal. Diferentemente de Hollywood, a história não é contada, e sim sugerida pelo que se passa pela cabeça do narrador. E por mais que exista uma narração, o personagem não conta a história, é como se ele apenas se lembrasse dela.

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