Sem antecipar meu gosto, digo que “Armadilha do destino” é um filme bem estranho, o que, aliás, não é nada de incomum em Polanski. O que gera esse estranhamento não é a característica claustrofóbica, uma marca do autor que se tem, por exemplo, em “O bebê de Rosemary” – uma belíssima obra desse que é um dos grandes cineastas da história – mas a mistura entre tipos psicológicos tão diferentes convivendo em um castelo ilhado em que sua estrada de acesso é coberta pela maré alta da praia. Um lugar em que o noivo George (Donald Pleasance) imaginava ser perfeito para ele morar com sua, muito mais jovem, noiva, um lugar que o livraria das “inconveniências” sociais. Ele é um industrial inglês que nunca deixa o seu papel de gentleman e que nunca toma uma atitude perante uma situação de conflito, o tornando um ser totalmente passivo diante dos outros. Já sua noiva Teresa (Françoise Dorléac), é uma francesa bem jovem que possui uma personalidade totalmente oposta. Não há logo no início como entender que os dois formam um casal de noivos, que apesar de ser visível uma intimidade amistosa entre eles, durante todo o filme não há nada que os ligue amorosamente, nada que faça imaginar o porquê que a jovem e decidida Teresa aceitaria viver com o passivo George num lugar totalmente rodeado por nada – lugar esse que ressalta o título do filme que é uma expressão para beco sem saída, que também ilustra o estado emocional do casal. O filme possui uma crítica comportamental na forma de humor negro sobre o jeito extremamente “inglês burguês” de George.
A trama tem início quando Dickie (Lionel
Stander) um bandido beberrão e espalhafatoso aparece diante do casal invadindo
o castelo e os obriga a lhe ajudar com seu comparsa Albie (Jack MacGowran) que
está ferido por tiros e posteriormente morre. Dickie se faz de hóspede do
castelo enquanto espera um transporte de seu chefe, que percebe-se que nunca
chegará, e durante esse tempo ele perturba a vida do casal sem nenhuma reação
por parte de George, o que irrita Teresa e faz com que ela goze da cara de seu
noivo, o provocando até mesmo junto com o bandido, como na cena em que os dois
jogam pedras na janela do quarto de George para fazê-lo cavar a sepultura de
Albie enquanto eles se embebedam com vodka. Como essa se tem várias outras
passagens durante o filme que se vê esse humor no conflito psicológico do
casal, em que ele não busca o interesse dela e ela o trai com muitos outros.
Nas cenas finais Teresa rouba a arma de
Dickie e a dá para George expulsar o bandido, este que o ignora e George sem
muita percepção de suas ações atira todas as balas do revólver e o mata depois
entrando num estado de delírio, é nesse momento que Teresa desiste dele e foge
com um amante pela estrada que some com o aumento das marés, George, arrependido
de deixa-la ir, corre atrás dela enquanto a maré enche e ele se vê ilhado em
cima de uma pedra e chorando – uma cena bem cômica no estilo Ben Stiller.
Um ponto alto do filme – além da beleza
francesa provocadora de Françoise Dorléac - é o personagem vivido por Lionel
Stander, que me fez rir e também me fez lembrar logo de cara, tanto pelo porte
físico como pela voz, do ator Mickey
Rourke nos dias atuais. Outro elemento bem interessante é a trilha sonora
jazzística de Komeda que também incorpora o humor colocado no filme por
Polanski. Porem diferentemente de outros filmes deste grande mestre, as
estranhezas de Cul-de-sac não me
agradaram, o filme possui momentos que, na minha visão, se alongam e rastejam
desnecessariamente atrapalhando seu rítimo e também não há sentido de aquele
casal existir, principalmente naquela situação de em dez meses de noivado estar
vivendo no meio do nada de uma maneira totalmente apática e feiamente estranha.