domingo, 30 de maio de 2010

"Antes da revolução", por Filipe Marcena


No alegórico If..., do diretor Lindsay Anderson, a protagonista é College House,
uma típica escola britânica para meninos que serve cenário para os personagens. Como Mick Travis (Malcom McDowell, antes de estourar com Laranja Mecânica) que, assim como seus colegas, está voltando para as aulas após férias. Com um denso bigode, reflexo de sua ainda pueril rebeldia, Mick detesta o ambiente escolar. A College House funciona como uma ditadura, onde a obediência e a disciplina andam sorrateiras pelos corredores à procura de um infrator. O diretor escolhe alunos Seniores para ajudar no controle dos alunos Junior, utilizando métodos violentos de repreensão. Mick também acredita na violência, mas tem uma concepção própria, idealizada sobre o assunto. O choque entre opressão e rebeldia atinge o estopim quando Mick e seus amigos são penalizados por beber na escola.


Inspirado em Zero de Conduta de Jean Vigo, If..., que apesar de fazer parte no divisor ano de 68 e de ter absorvido as influências da contracultura, foi filmado meses antes do evento mais significativo do movimento, as revoltas estudantis em maio daquele ano. O filme de Anderson capturou o espírito jovem em voga quase fez um presságio dos atos rebeldes que aconteceram logo em seguida, e ainda soam controversos se pensarmos nos famigerados casos de alunos invadindo suas escolas com metralhadoras. Teorias defendidas à parte, If... é de um apuro técnico primoroso. Anderson trabalha sobre uma atmosfera repressora, com os imponentes cenários da escola representando não só uma instituição de ensino de método rígido, mas quase um presídio. Tanto que na única sequência onde dois personagens saem para a rua, o filme se desprende da narrativa e se desenrola livre e imprevisível, exibindo a mesma sensação de liberdade dos protagonistas. As tomadas em preto-e-branco, tão questionadas na época, foram uma escolha técnica resultante de um defeito de iluminação, e que acabou se tornando um estilo. E o filme ainda evita trilhas sonoras, utilizando-se apenas de canções de coral de garotos nas cartelas que dividem a narrativa em capítulos, o que acrescenta na atmosfera alegórica.

If... foi um sucesso surpresa de bilheteria, venceu a Palma de Ouro no Festival de Cannes e influenciou uma geração, o que serviu como mais uma prova de seu acerto na representação do zeitgeist de 68, para a surpresa da Paramount, que investiu pesado no fiasco Barbarella no lugar do filme de Anderson. Trunfo de um filme que sobre transportar o macro para o micro de forma audaciosa, ressonante e até mesmo fantástica, especialmente em seu final de abordagem quase surrealista, cheio de fúria. Um clímax horripilante que encerra o filme de maneira assustadoramente profética. Na época, muitos protestaram contra a violência de If..., colocando-a em questão algo incitador. Engraçado como o filme parece ser um contra-argumento em si mesmo, especialmente por causa de seu intrigante e desafiador título.
Um dos filmes mais importantes da new-wave britânica.

Um comentário:

  1. Run in the Corridor!
    assim também o colégio onde estudei, irlandês em Buenos Aires, 1974-1979, com padres irlandeses. Assisti "If..." dois anos depois e tinha várias similaridades da vida escolar parecidas. Não dormiamos lá, saiamos as 16:30, mas usavamos gravata, blazer, e a disciplina.
    Coisas que acho que no Brasil já tinha sido abolido há décadas, a começar pelos uniformes.

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