segunda-feira, 10 de maio de 2010
"Quando não retornamos e voltamos sempre" por João Roberto Cintra
“Promise me you’ll come back to me…” “I promise, I’ll come back to you… I promise...” Ok. O filme em questão não é “O paciente inglês”. Nem a dona de casa é a mesma de “As pontes de Madison” – esperando o fotógrafo Clint Eastwood voltar. Nem os amantes que anseiam pela consumação do amor (não apenas do sexo) se chamam Jack Twist e Enis Del Mar. Mas, o título filme em questão, “Desencanto", mesmo sendo uma péssima tradução de “Brief Encountrer”, ainda serve para marcar uma tradição do melodrama que segue forte até hoje para plateias que adoram sofrer com as desilusões dos outros ou tentam expurgar suas próprias.
O filme de David Lean, entretanto, não é mais um filme romântico xaroposo como tantos outros – e não se entenda por xaroposos os outros filmes acima citados. Trata-se de um clássico do cinema britânico, cultuado e adorado até hoje, como uma alegoria da melancolia do pós-guerra. Não se pode dizer que seja exatamente atual, no sentido de que, para a visão de hoje, ele é posto como quase um filme de época – mesmo que tenha sido contemporâneo no seu tempo. Entretanto, como os sentimentos tratados no filme podem ser de época, datados, se são próprios da condição humana em si?
Laura (Célia Johnson, ótima atriz, beleza mediana, que não ofusca seu desempenho) é uma ordinária dona de casa, que, em um acidente trivial, conhece o médico Alec Harvey (Trevor Howard, galã de época, bom partido até hoje, daqueles homens que deixam as mulheres pensando: “Por que eu não encontro alguém assim?”), também casado, cujos encontros ao acaso os levam a alimentar sentimentos mútuos, mas impossíveis para o bem social de ambos. Drama instalado. Mas não há como agir sinicamente a ele.
Mesmo seguindo essa tradição, a narrativa é uma boa surpresa. O filme começa pelo desfecho, mas a não linearidade não estraga a história, e sim dá a ela nova dimensão. O que acompanhamos não é o desenrolar de fatos: são as memórias de Célia sobre os poucos dias em que teve contato com Alec. Coitada. Casada, não pode compartilhar sua angústia com o marido. Sem amigas próximas – bem, e a quem confessar algo assim? – ela vive seu pequeno segredo contando a história para si mesma, quase como quando enlouquecemos passando mil vezes a mesma versão dos fatos na cabeça.
Seu drama contrasta com a sobriedade das locações e do roteiro em si. Não há vazão para choros histéricos, não há lugar para a falta de compostura.Até linda fotografia em preto-e-branco parece a certa hora sufocar os amantes, seus sentimentos, como se sua história amoral fosse estragar o cenário. O tom melancólico é mais acentuado pela música de Rachmaninov, um concerto para piano, bonito e triste. Torcemos para um final feliz apenas para nadar contra a corrente, mesmo sabendo que não vai existir. Desde antes de “Romeu e Julieta” essa batalha é perdida – e continuamos a torcer, pedindo para que Sam toque outra vez: “You must remember this/ A kiss is still a kiss/ A sign is just a sign...”(E o avião parte outra vez para longe.)
Amores impossíveis, amantes solitários. No fim, a memória é o lugar seguro para o qual sempre voltamos para encontrar quem deixamos para trás. Mesmo que a promessa – ou a esperança – de volta não tenha se cumprido.
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