sábado, 29 de maio de 2010
"Um Gosto de Mel/A Taste of Honey (1961)" por Pedro Coelho
Estamos diante de um filme que explora um universo marginal: proletários, mulheres criando seus filhos sozinhas, crianças nas ruas, bêbados, gays, negros, jovens subempregados alugando pequenos apartamentos pelos sujos bairros de cidades industriais inglesas do pós guerra. Dentro deste universo trata-se de temas que ainda hoje são fortes, na época eram verdadeiros tabus para a sociedade: aborto, preconceito racial, homossexualismo.
Dito desta forma, parece ser um filme duro. Mas sua maior qualidade é a forma delicada que este ambiente é tratado. A estória é contada pela ótica de Jo, uma menina sensível criada por uma mãe solteira endurecida pela vida. Ela anda pelas ruas proletárias e zonas portuárias observando aquele mundo decadente de uma maneira tão ingenuamente poética como só um jovem moça poderia transmitir.
Jo sente desde cedo o peso da liberdade individual e das inseguranças de um mundo desprovido de convenções sociais: família e escola nunca havia sido uma realidade para ela. Mas mesmo diante deste ambiente árduo, ela não perde as fantasias e puerilidades. Em vez dela se adequar ao mundo, ela reconstrói o mundo de acordo com sua visão. Jo vai trabalhar, morar sozinha, se apaixona por um marinheiro negro que parte deixando-a grávida, e conhece um gay com quem começa a viver junto. Ela atravessa esses percalços da vida de maneira mais humana possível.
A apropriação que o filme faz da visão de mundo desta moça ingênua porém acostumada com o árduo mundo, permite ao filme esse angulo único. As sensações de Jo diante das paisagens urbanas, das fachadas dos edifícios, das, dos rios, das brincadeiras de crianças nas ruas, dos parques de diversão ao ritmo de Jazz band. Todo universo marginal que citei mais acima é, na verdade, só o pano de fundo para existências profundamente humanas e universais.
Mas não se deve esquecer que A Taste Of Honey é um típico exemplar de kitchen sink drama dirigido por um verdadeiro angry young man. Essa visão poética de vidas periféricas não procura higienizar esse universo. Em um cinema dominado por um visão de mundo exclusiva, mostrar uma outra perspectiva, partindo não dos dilemas da burguesia em relação aquele universo, mas dos dilemas internos que ali operam e mostra-los tão universalmente reconhecíveis é uma maneira muito mais inteligente e sensível de lidar com os conflitos sociais.
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O último parágrafo da sua crítica é excelente. Você deveria reescrevê-lo, pois está um pouco confuso, mas mesmo assim, é muito elucidativo e profundo. Gostaria de ver esse filme ou comprá-lo, mas não sei como. Vou continuar tentando. Abrç.
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