domingo, 18 de abril de 2010

"Adeus, mr. Chips" por Gibran Khalil de Espindola Brandão




De onde vem a fleuma britânica? Vem da disciplina, da ordem, da moral inalienável, da polidez e do senso de justiça e amor a pátria. É isto que nos apresenta o filme Goodbye, Mr. Chips (Sam Wood, 1939). Charmoso e leve, com seus momentos de riqueza humorística e melodrama equilibrado, o filme nos conta a vida docente de Mr. Chips (para os íntimos) em uma escola tradicional da Inglaterra e sua saga em prol do futuro da nação e da manutenção das instituições britânicas. Assim, o filme é um instrumento ideológico típico desta fase do cinema britânico ao frisar uma temática patriótica; propaganda de suas instituições seculares e da dignidade do povo britânico. Mr. Chips, não por acaso, se torna professor no auge do imperialismo.

Em 1870 (período mais forte do colonialismo britânico) era o professor iniciante e antiquado, que tenta de todas as formas conquistar os corações dos alunos, desejo alcançado graças a influência de sua esposa maternal e carinhosa – e com tendências levemente feministas. Com a Sra. Chips, o professor aprende a penetrar no coração da infância de forma a conseguir humanizar os seus alunos de forma mais fácil. Com o passar dos anos, o protagonista deixa de ser um mero professor e se torna um símbolo da própria instituição; imutável perante as dificuldades. Mesmo durante os bombardeios da primeira grande guerra, Mr. Chips mantêm-se impenetrável em seu senso de humor e justiça.

Enquanto várias gerações de crianças passam pelos muros da escola, a sala comunal e Mr. Chips permanecem intactos. Mr. Chips é o símbolo dos laços que promovem a identificação do britânico como membro de uma sociedade disciplinada, justa, moralista e senhora de sua história e tradição. E como tal, moralistas e disciplinados devem ser os jovens do futuro para a permanência da soberania da nação. O olhar do filme reflete o momento particular que vivia o Reino Unido. Flagrando-se em ruína, e imerso em uma nova guerra sangrenta, o que o país mais precisava era justamente a edificação de uma ideologia de nação, patriotismo e identidade nacional. Em meio a guerra, o povo britânico precisava de motivos para lutar, algo a proteger.

O que muito me chamou atenção no filme foi a imensa passividade dos alunos. Como tábuas rasas, recebiam as ordens e conhecimentos sem questionar. A autoridade dos professores é recebida pelos jovens sem resistência e até com certa alegria. A escola é, então, na visão fílmica, uma instituição total semelhante a um convento - voltada para formar seres humanos mais humanizados – ou mais britânicos!
Neste ponto, uma comparação entre o filme de Lindsay Anderson, If...(1968) e Goodbye, Mr.Chips é inevitável, quase que obrigatória.

Lindsay Anderson parece questionar desde o título do filme; “E se os alunos do Mr. Chips não aceitassem a autoridade da instituição?”, “E se tentassem resistir?”. Mesmo que de forma exagerada, o diretor critica essa passividade do aluno frente o professor, do individuo frente a autoridade, o britânico frente a imposição da pátria. If... de certa forma é a visão do aluno frente a instituição total. Mr. Chips pode ser representado como aquele professor risonho que joga bombinhas nos alunos no exercício militar e acha o sistema uma maravilha - atuando idealisticamente frente a realidade das estruturas de poder presentes. A instituição total de Lindsay Anderson não é mais um convento, mas sim, um presídio ou um manicômio, cercado por perversão e hipocrisia.

Épocas diferentes, visões de mundo e interesses diferentes. Obviamente, Lindsay Anderson queria ruptura enquanto que Sam Wood e toda uma nação em profunda ruína e imersa em uma nova guerra queriam união. Goodbye, Mr. Chips é esta tentativa de encontrar um ponto comum onde se amparar diante da dificuldade de sobrevivência. O encontro com as instituições edificantes da identidade britânica, como a família, a educação e as forças armadas parecem contar as possibilidades de permanência frente a adversidade, através da disciplina, da moralidade, da razão e da fidelidade. Mr. Chips dá forças, pois resiste. Resiste a tudo e aponta para um futuro além da guerra e do sofrimento, um futuro edificado pela natureza humanística da tradição que não pode ser destruída, responsável pela origem de um império forte e rico, um desejo de retorno a um período muito melhor do que a realidade da época.

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