sexta-feira, 23 de abril de 2010

"Desencanto" por Bruna Belo


Em meio aos desastres da II Guerra Mundial, na Inglaterra, David Lean – diretor de famosos e grandiosos épicos, como Lawrence da Arábia e Dr. Jivago – filmou o um romance Desencanto, o qual seria, mais tarde, uma de suas obras-primas, indicado a três Oscar – melhor atriz, roteiro e diretor – além de ter sido premiado pela crítica no I Festival de Cannes e pela Associação de Críticos de Nova Iorque.

A não-linearidade narrativa, característica de Lean, também está presente neste filme. Para isso, ele conta a história pela perspectiva feminina, fazendo uso da narração em off e de flashbacks, assim, o filme começa pelo desfecho final, dessa forma, quando o longa acaba ele esclarece o espectador, ao invés de surpreendê-lo.
O excelente roteiro de Noel Coward, baseado em sua peça "Still Life", juntamente com a emocionante interpretação de Celia Johnson, que interpreta a dona de casa Laura Jesson, conseguiu retratar magistralmente o psicológico feminino – por vezes submisso, exageradamente romântico e idealizador, como antes da guerra, antes das mulheres começarem a ganhar mais espaço na sociedade –, mostrando todos os seus sonhos, dúvidas e medos. O filme é a história do amor proibido vivido por esta personagem e o médico Alec Harvey (Trevor Howard), dois personagens ordinários – por volta dos quarenta anos, casados e de classe média – que, em uma quinta-feira, se conhecem em plena uma estação de trem, devido a uma situação banal.

Apesar da repentina paixão, o casal não chega a, de fato, consumar o adultério, pois ambos são bastante presos aos preceitos morais burgueses, resquícios de uma Inglaterra pós-guerra que tenta se recuperar das perdas materiais e humanas, além da perda de muitos dos seus costumes. Por este motivo o filme é considerado um precursor do “realismo burguês” – uma série de filmes que retratam de forma intima a família inglesa, sobressaltando a moral e os bons costumes.

A plataforma de trem foi o lugar perfeito para a locação desse filme, passa uma idéia de temporalidade, transitoriedade, efemeridade, passando para o espectador toda a essência da relação entre os dois personagens. O hábito que ela tem de ver o expresso passando e o trem dele partindo deram uma nova conotação as estações, que, a partir desse filme, passaram a ser locais mais românticos.

Apesar do longa não ter o que se chamaria de final feliz, no qual os dois personagens ficariam juntos – o que, provavelmente, foi a causa da pouca receptividade do filme pelo público na época que foi lançado –, é um lindo romance, com diálogos casuais, que junto com a excepcional interpretação do casal, fazem a história fluir de forma natural. É gostoso de ver, e a cada dia se torna mais interessante pela simplicidade e honestidade da relação dos dois, uma paixão a moda antiga, com um romantismo, por vezes exagerado, mas que não se vê com freqüência hoje em dia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário