sábado, 14 de fevereiro de 2015

"Os anões também começaram pequenos", por Nuno Aymar




O cinema alemão deixou um grande legado no que se refere às temáticas do grotesco, pitoresco ou simplesmente daquilo nos provoca repulsa desde o expressionismo. Herzog assumiu essa herança ao revisitar esses temas e de aprofundá-los na perspectiva de um cinema moderno e capaz de penetrar por alegorias mais complexas, sendo Os anões também começaram pequenos, o mais radical dos seus trabalhos nesse aspecto.
O filme usa de uma linguagem bastante alegórica e de humor negro, criando um micro universo onde só existem anões (muitas vezes deformados) e moralmente repulsivos. Existe uma discussão latente ao longo do filme cujo coloca a natureza como um lugar de caos, refletindo a própria ideia de sociedade humana. Herzog desenvolve uma antirrealidade que nos aproxima daquilo que seria um estado perverso de natureza. A natureza se torna em si um lugar de desordem e no decorrer do filme uma série de planos vai revelando, pelos próprios animais, o que a sociedade humana considera repulsivo: Uma galinha que devora a outra, porcos amamentando na mãe morta; cada momento do filme é pontuado por esse jogo entre imagens “da natureza” e a sociedade dos anões. Além disso, o filme ainda apresenta um descompasso estilístico. As blasfêmias nos chocam com seu humor estranho, muitas vezes infantil, trabalhando o caos alegórico em cenas de puro nonsense.

O filme se define pela sua capacidade de provocar o estranhamento sob si mesmo, não sendo o mesmo estranhamento recorrente em outros filmes de Herzog,  tratando mais de inverter essa relação e perceber como lidamos ao ver os elementos que só nos existem enquanto objetos de repulsa.

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