quarta-feira, 23 de junho de 2010
"If", por Rinaldo da Silva Pereira Junior
O ufanismo exacerbado e o apego à tradição e as instituições repressivas como igreja, estado, família e escola são os principais e mais recorrentes temas da fabula surreal e alegórica que é IF... . Desde a apresentação da escola College Hall, a proposta é de mostrar a Inglaterra como repositório de um arraigado esnobismo megalomaníaco e isso vai ser simbolizado no fato da escola estar fora e longe dos limites da cidade, que só é mostrada uma vez numa sequência surrealista, tornando a instituição inacessível á qualquer tentativa de modernização ou de correção de seus métodos sádicos e transformando-a em um microcosmo que espelha a Inglaterra.
A divisão hierárquica social e o enaltecimento dos valores da classe media são representados pela divisão dos alunos em juniors e seniors e pela submissão dos juniors aos ‘whips’ sádicos e pervertidos que abusam dos privilégios dados à eles pelo nível mais alto da pirâmide: o headmaster e seu conselho de múmias caquéticas e servem como elemento intermediário da repressão que vem de cima para baixo e reverbera no sentido contrário em forma de resistência violenta ao padrão. Entre os privilégios dados aos ‘whips’ o mais abusivo deles é o de fazer uso dos juniors (seus ‘scums’) como serviçais em tarefas como preparar chá e aquecer a água do banheiro.
College Hall é um modelo de intolerância. Quando da chegada do grupo de volta ao ano letivo, Mick esforçasse em esconder sua barba por trás de um cachecol, até que cedendo à pressão a tira. Seus cabelos longos e os de seus colegas irritam profundamente o senso estético britânico na figura sempre vigilante dos ‘whips’ e desvios de conduta são corrigidos na base da mais violenta disciplina, o que justifica o titulo de ‘whips’ e dá ao filme uma de suas sequências mais cruéis.
College Hall e seus alunos é uma metáfora do conflito entre uma tradição moribunda e a reformulação e abertura de valores que já batia na porta do império havia muito tempo, e que na verdade já estava colocando-a abaixo. A estória se passa nos anos sessenta e tenta dar conta dos movimentos estudantis do final da década e da escalada vertiginosa da liberação sexual que tomava conta da Europa e quem em pouco tempo corroeria a estrutura das instituições tradicionais mundo afora.
Enquanto as mini-saias e o rock faziam a cabeça da juventude na swinging London, os Juniors de College Hall são obrigados a freqüentar missas e ouvir discursos vazios e irreais da Inglaterra como ‘powerhouse’ e ‘ilha única’ e ainda agradecer seus algozes pelos castigos físicos impingidos, além de passar por constrangedores exames médicos.
Travis é símbolo dessa juventude que está lá fora e em breve será maioria e que logo vai ditar um novo modelo de comportamento. Inconformado e rebelde ele vai preparar o terreno para a completa desintegração do velho sistema, pelas armas e pela violência. Sua filosofia é contundente. Sua declaração bombástica de que “ Não existe guerra errada” e que “ Violência e revolução são os únicos atos puros “ refletem o espírito da juventude da época e sua insatisfação com os decadentes modelos vigentes duramente sustentados pela velha guarda. Travis, porém não é o único modelo de ruptura. Seus colegas fumam e bebem às escondidas. E já ouvimos declarações sobre famílias disfuncionais.
IF... é inscrito numa tradição de filmes de escola, de onde o precursor e protótipo é zéro de conduite de 1933, obra do diretor francês Jean Vigo, de onde IF... é declaradamente influenciado. Muito debatida também é a questão da utilização de película preto-e-branco e sépia em algumas passagens. Ao contrario do que a principio pode-se imaginar, a variação parece não se dever à questões estilísticas ou narrativas mas sim à questões muito mais pragmáticas como a facilidade em se filmar nestes tons mais do que em cores em determinados ambientes, a limitação no tempo de uso das locações e até limites no orçamento.
O tom surreal que o filme toma a partir da fuga para Londres e com a entrada do personagem feminino da garçonete do café parece apontar para a transformação radical pela qual o mundo, a sociedade tradicional e o comportamento vão passar após as barricadas contestatórias da nova geração pós-68, e a dificuldade da velha ordem em aceitar e conviver com esse novo e irreversível estado de coisas. A partir daí tudo parece irreal: College House transforma-se de súbito em campo de treinamento militar, em seu porão é encontrado um enorme arsenal, que não encontra razão de existir dentro de uma instituição de ensino e que será utilizado pelo exercito de resistência de Travis e temos finalmente reunidos simbolicamente no discurso moralista final os representantes das grandes instituições tradicionais, o estado e seu braço militar, a igreja, a família e é claro a educação repressiva.
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