quinta-feira, 24 de junho de 2010

Narciso Negro (1947), por Juliana Ribeiro


“Há uma atmosfera na região que exagera tudo”. Esse foi o motivo pelo qual Dean não queria um convento em primeiro lugar. Os motivos de Dean e a forma como são colocados em cena os personagens mostram claramente seu machismo, achar que as mulheres seriam as mais afetadas pelo confinamento numa região estranha, exótica e distante. O que no filme não deixa de ser uma verdade.

Narciso Negro, inspirado no livro de mesmo nome, dos diretores Michael Powell e Emeric Pressburguer, narra a trajetória de cinco freiras anglicanas que são levadas a montar um convento no Himalaia. Todas são perturbadas de algumas forma pela região, mas duas delas são praticamente levadas à loucura pela presença de Dean, que aparece como uma presença masculina ameaçadoramente sensual, que deixa dúvidas no espectador se ele busca realmente ou não um relacionamento com alguma das freiras.

A atmosfera exótica não combina em nada com a aparência delas, sempre com lábios rachados, muito pálidas e com olheiras acentuadas. A ausência de cor delas é sem dúvida o maior contraste com a região, que é indubitavelmente sensual. Narciso negro é o nome do perfume que um general, aluno das freiras, sempre carrega consigo, fragrância esta que as perturba. Talvez este aluno e Kanchi (uma das alunas) sejam a materialização de toda a sensualidade ao redor das freiras. Kanchi, sempre arrumada, com tornozelos a mostra e olhares arrebatadores, quer ter um marido e vê na presença do general um pretendente em potencial. Tudo parece divergir da vida casta que freiras buscam. No decorrer do filme elas se deixam envolver muito mais por essa “atmosfera”, pelo vento sempre presente que parece querer abalar as estruturas dessas personagens.

Mas o que o filme traz de mais especial seria o olhar exótico do próprio exótico. Os personagens são introduzidos como colagens deles mesmos, quase didaticamente, são nos apresentados e suas possíveis fraquezas. A irmã Ruth, no entanto, é a única que não é apresentada de maneira primária, provavelmente para criar a expectativa de uma personagem que não vai mudar muito de no decorrer da narrativa, mas sim se mostrar.

Mas Narciso Negro é envolvente principalmente por conta dos trabalhos belíssimos dos atores. Talvez algumas cenas pareçam estranhas não pelo diálogo ou pela atuação, mas por escolhas estéticas da direção, que preenche o filme de bizarrices, que são ao mesmo tempo dramáticas e hilárias. Enfim, cheio de surpresas.

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