quarta-feira, 23 de junho de 2010
"Irina Palm", por Lucas Freire
Um certo nome percorre de boca a boca por toda Londres. Que nome seria? Quem de fato seria essa pessoa? Sim, sim, como não poderia saber quem é Irina Palm! Ela é dona do nome mais ouvido atualmente nas esquinas e pubs ingleses. Há comentários por toda parte. “que mãos macias tem a Irina”, “nunca me tocaram daquele jeito, foi fantástico!”, “vou todos os dias à cabine dela, ela consegue me satisfazer, coisa que minha mulher não faz a muito tempo”. Esses comentários são comuns diante da técnica e inovação desenvolvida por Irina Palm para estimular os rapazes da região. Mas, quem imaginaria que por detrás daquela parede e através daquele buraco, existiria uma senhora sexagenária, sem graça e como diria ela mesma “desmazelada”? Este é o impacto que o filme de mesmo nome, Irina Palm, nos demonstra: uma mulher de vida pacata que por necessidades familiares, adentra num mundo no qual jamais imaginaria se envolver.
Maggie é uma senhora, por volta dos 60 anos, que tem uma relação muito afetiva com seu neto Ollie. Mas seu neto tem uma doença rara e sem tratamento específico, e com isso, tem poucas semanas de vida. Por um momento de esperança, o médico do menino avisa aos seus pais e a sua avó que existe um tratamento em desenvolvimento na Austrália e que eles aceitam o garoto para iniciar tal experiência. Mas como sempre existente nos filmes, algo aconteceria para impedir ou dificultar a ida de Ollie para a Austrália, e de fato, acontece: a equipe de médicos australiana concede o tratamento gratuitamente, porém, todos os custos de passagem, hospedagem e do hospital seriam arcados pela própria família. A família, desde sua primeira aparição na trama, aparenta ser do subúrbio londrino e obviamente não teria condições alguma de pagar tais despesas.
Maggie, com um desespero disfarçado por sua feição inerte e ingênua, segue para todas as possibilidades mais óbvias de se conseguir dinheiro: empréstimo e emprego. Um empréstimo para uma senhora sem renda fixa e de poucos bens é praticamente inviável e empregar uma idosa é algo fora de cogitação dentro do âmbito profissional. Como um acidente (ou destino), Maggie por engano acaba por entrar numa típica casa noturna, na qual oferece de todo tipo e forma de prazer. Uma coisa foi levando a outra e Maggie se deparou diante do dono da casa noturna, o Miki. Como todo chefe de prostíbulo cinematográfico, ele tem feições maldosas, um Q de mistério e é bem direto com suas intenções. Maggie, mesmo sabendo que poderia ganhar 600 dólares na semana, não como prostituta, mas como masturbadora alheia, retorna para casa indignada com tal proposta mas, no dia seguinte ela cede aos sentimentos por seu neto e se submete a este emprego obscuro.
O filme narra a trajetória desta senhora que, por questões familiares, se torna a mais famosa em sua área no que se diz respeito à estímulos manuais. No decorrer do filme, Maggie passa a se distanciar de seu neto, não por desinteresse, mas por necessidade de separar do seu neto aquele mundo em que ela vivia. Por sua vez, a maneira que ela encontra de suplantar tal distanciamento é trabalhar mais e mais para conseguir a quantia desejada para os custos da viagem à Austrália. Sua colega de trabalho, Luisa, lhe aconselha a separar essas duas vidas. Segundo ela, segue-se uma vida em casa, tomando conta dos filhos, cozinhando, passando roupa e à noite, na casa noturna, adere-se a outra conduta, outra vida, e tudo aquilo que foi vivenciado durante o dia deixa-se para trás. O pior erro, segundo Luisa, é misturar ambas as vidas.
Maggie não parece se importar muito com isso. Tal fato fica claro quando, depois de um tempo de prática, ela tenta humanizar o ambiente de trabalho dela. Em sua cabine, ela pendura um quadro de seu falecido marido, põe um jarro com flores em sua mesa e leva consigo livros para ler enquanto alegra seus clientes.
Aos poucos, é notável a aproximação entre Maggie (que aderira ao nome artístico Irina Palma, diante seu sucesso) e seu chefe, Miki, que no decorrer da trama, vai desconstruindo sua imagem inicial e passa a demonstrar uma sensibilidade engatinhante. Quando por fim Maggie consegue a quantia desejada, ela o entrega a Tom, o pai de Ollie. Mas toda aquela quantia, em dinheiro, surgindo aparentemente do nada nas mãos daquela senhora desperta a curiosidade de seu filho. A partir daí os planos começam a dar errado. Tom começa então a segui-la, a indagá-la por toda parte até que descobre de onde vem sua renda financeira. Isso desestabiliza a relação geral da família, e o filho de Maggie a obriga a largar aquela função, caso contrário, não mais entraria em contato com seu neto. Tom, por um momento de euforia, se nega a aceitar o dinheiro graças a seus pensamentos estarem alojados em leis hipócritas de moralismo e ética. O sentimento e a necessidade fala mais alto. O pai de Ollie aceita o dinheiro e parte para a Austrália com sua esposa e seu filho e paralela a isso, Maggie recusa acompanhar a família e volta para a casa noturna, para a sua função e para seu mais novo amor, Miki.
O filme retrata claramente os limites e anseios de um ser humano para ajudar uma pessoa próxima. Nele, podemos perceber que, mesmo uma senhora de idade, que passou uma vida inteira com uma conduta de moça pacata e ingênua é capaz de adentrar num mundo dito “obscuro” pela sociedade com um único intuito, salvar a vida de seu neto. Por sua vez, o filme não cai nessa mesmice. Ao invés de nos mostrar a degradação e o sacrifício de uma senhora imersa neste mundo de sexo, o filme nos mostra um outro lado. Maggie, ou melhor, Irina Palm, conhecida e famosa por suas técnicas de masturbação, é elogiada e respeitada por todos no filme, e, só nesta situação, conseguiu achar alguém que lhe amasse, respeitasse que lhe fosse fiel, o Miki. O sentimento final que nos é passado é de inversão dos valores ditos morais e éticos da sociedade. Porque uma senhora não poderia viver nestas condições se ela estivesse feliz consigo mesma? Porque não se deveria amar um homem apenas por sua profissão? Irina Palm responde a todas essas perguntas no filme, e ela diz sim a todas elas.
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