quinta-feira, 24 de junho de 2010

A Inglaterra de Austen, por Annyela Rocha


Jane Austen escrevia estórias de mulherzinha, definitivamente. Refinadas, irônicas, críticas até, mas todas mamão com açúcar, românticas, com um toque de drama e enredos extremamente parecidos. Ainda assim, é um dos nomes femininos mais marcantes na literatura mundial. Seus clássicos como Razão e Sensibilidade, Persuasão e Orgulho e Preconceito inspiram roteiros e releituras até hoje. Ultimamente, por exemplo, a moda é adicionar monstros e lutas nos romances da inglesa – e assim foram lançados Sense and Sensibility and Sea Monsters e também Pride and Prejudice and Zombies.

Mas vamos deixar as criaturas bizarras de lado. Vamos voltar para as estórias de mulherzinha. Vamos falar de Keira Knightley e de um Mr. Darcy lindo interpretado por Matthew MacFadyen. Estamos pensando então no filme Orgulho e Preconceito, de 2005, dirigido por Joe Wright. Segunda adaptação do livro para filme, o trabalho de Wright marca sua estreia como diretor em cinema.

A saga da família Bennet é, em suma, a mesma de outras famílias criadas por Austen: filhas pobres da área rural que veem num casamento a chance de suas vidas. E o casamento não é só oportunidade, mas necessidade. Essa temática escolhida por Jane Austen servia para criticar os costumes ingleses do século 18. No filme a crítica irônica da autora se revela, mas não chama muita atenção. Wright se centrou mesmo foi no amor iminente entre o casal principal da trama.

Elizabeth Bennet, interpretada por Keira Knightley, é a protagonista que acaba encantando o ricaço Sr. Darcy, apesar da rejeição inicial que os dois têm um pelo outro. Assim como Meg Ryan e Tom Hanks já discutiram em outro filme de mulherzinha (You’ve got mail, dir. Nora Ephron, 1998), nunca saberemos ao certo quem é o orgulhoso e quem é o preconceituoso no romance. Fato é que os dois personagens são orgulhosos e os dois se rejeitam reciprocamente antes de se conhecerem.

Nessa atuação que rendeu a primeira indicação ao Oscar para Keira, ela consegue transmitir com perfeição a inconstância dos sentimentos de Elizabeth. E cumpre bem o desafio da personagem de transparecer para o público sua paixão por Darcy ao mesmo tempo em que esconde de si mesma esses sentimentos. Mostrar sem deixar escancarar, querer e esconder. Além de mostrar a teimosia constante da personagem. A atuação de MacFadyen também é muito boa, dando vida ao quase sempre inexpressivo Darcy, que de tanto esconder os sentimentos aparenta ser uma pessoa fria, sem sentimentos. Apesar de não haver nenhum beijo entre o casal (com exceção da cena do final alternativo, nos extras do DVD), a química entre os dois é excepcional.

A direção de fotografia de Roman Oshin acentua ainda mais essa questão sentimental. Planos detalhes de pequenos gestos, como o toque entre as mãos dos dois quando inesperadamente Darcy ajuda Elizabeth a subir numa carruagem, dão paixão ao filme. Pequenas trocas de foco entre primeiro e segundo planos são outra constante que dão um ar gracioso à narrativa. E, obviamente, as belas paisagens nas tomadas externas, que realçam o patrimônio inglês, retratando a Inglaterra antiga. A ideia de patrimônio é firmada principalmente através das grandes casas rurais, do castelo da família Darcy, da igreja e do belo cenário em que o Mr. Darcy se declara para Elizabeth pela primeira vez.

Para completar esse retrato dos costumes ingleses de época, a direção de arte e o figurino são impecáveis, embelezando ainda mais a fotografia e criando ambientes detalhados e fiéis. A trilha sonora também é marcante, mas não chega a ser exagerada, apenas destacando discretamente os momentos chave do crescente amor entre o casal de protagonistas.

Orgulho e Preconceito não é tão doce quanto os romances norte-americanos, conseguindo manter o ritmo apesar das duas horas de duração. Muitos dos diálogos são uma transposição exata do livro de Austen. Pode não ser a adaptação preferida dos ingleses, nem a definitiva, mas ainda assim uma das mais belas e esteticamente bem acabadas.

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