quinta-feira, 20 de novembro de 2008

"Um Gosto de Mel (A Taste of Honey, Tony Richardson, 1961)" por Eduardo Rios



“Um gosto de mel”, filme dirigido por Tony Richardson em 1961, é exemplar na representação de sujeitos, posições e identidades periféricas. A película narra um pedaço da vida de Jo (Rita Tushingham), uma adolescente em busca de respostas para seus conflitos existenciais, para o seu modo de viver e enxergar a vida. A protagonista possui uma relação de pólos com sua mãe Helen (Dora Bryan): por vezes sentem falta da outra, por vezes já não mais se suportam; por vezes cuidam da outra, por vezes são indiferentes.

Os diálogos entre mãe e filha são um espetáculo à parte no filme, pois são nesses momentos que o naturalismo consegue aparecer com mais força nas conversas e interpretações. Os assuntos abordados não necessariamente apresentam continuidade. São facilmente trocados ou intercalados, como na vida real. Se as duas personagens começam a falar da idade da mãe, uma delas avista uma peça de roupa e pergunta se a outra acha bonito aquele vestuário, o qual já remeterá a outro assunto, e assim por diante. Fica bastante claro, no decorrer do filme, o choque entre esse naturalismo que começa a se infiltrar no cinema e entre o cinema tradicional da época, identificado em elementos como a trilha sonora e a impostação de voz dos atores, principalmente a de Dora Bryan.
Além da própria mãe, Jo se relaciona com outras duas pessoas. Um marinheiro negro (Paul Danquah), com quem vive uma paixão que termina por gerar uma gravidez; além de Geoff (Murray Melvin), um homossexual com quem a protagonista vive um amor de irmãos. Os personagens vem e vão da vida de Jo sem muitas despedidas calorosas ou cartas extensas, apenas poucas palavras ou um pequeno bilhete assinam o adeus. Na verdade, o filme tenta mostrar uma solidão vivida por várias pessoas da classe operária da Inglaterra. Todos possuem orgulho e carência demais. Todos querem ter uma companhia, mas não abrem mão de dizer as verdades que os incomodam. É como se a relação entre os personagens estivesse permeada pelo gosto do mel. Um gosto bom, saudável, que alimenta; mas rapidamente pode tornar-se enjoativo e causar náuseas, ânsias de vômito. O gosto é repudiado, mas perante a fome, volta a saciar.

Toda a trama é embalada por aparições de um grupo de crianças que sempre estão correndo e brincando. Quando os personagens estão em busca de algo ou alguém, mas não sabem como encontrá-lo, sempre recorrem às crianças, que possuem a resposta ou a atitude certa. É como se em meio aquele caos da cidade que provoca solidão, os garotinhos despreocupados com os “problemas da vida” estivessem envoltos de companheiros e cheios de alegria, sem medo de se sujarem em lamas ou poças. Eles estão despidos de preconceitos e prontos para entregarem uma luz aos olhos vagos de Jo na última cena do filme. A metáfora está embutida no gosto que os infantes possuem por coisas doces. Essas crianças parecem não enjoar nunca do gosto de mel.

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