segunda-feira, 8 de junho de 2009
"Ian Curtis sob controle" por Matheus Torreão Farias
Detesto essa mania que os diretores têm de, na hora de filmar artistas performáticos, colocá-los declamando frases teatrais a torto e a direito, como fizeram com Cazuza em O Tempo Não Pára (2004): uma afetação só. Quando começou Control (2007), fiquei com medo que Ian Curtis fosse a próxima vítima, assim que seu intérprete Sam Riley conversava com os amigos e de repente começou a declamar um poema de Wordsworth sem mais nem menos. Temi que ele acabasse desvirtuando o jeitão introspectivo e isolado característico da lenda que interpretava.
Felizmente, no entanto, foi tudo um grande alarme falso. Aliás, dentre todos os elementos do filme, nada me comoveu mais que a atuação do estreante inglês, que até então trabalhava em um atacado em Leeds. Enfrentou a própria insegurança diante dos atores mais experientes e dos fanáticos por Joy Division para fazer o papel principal desse filme tão ansiosamente aguardado pelo público e passou longe de decepcionar - muito pelo contrário. Ainda que não copie com exatidão a voz e os trejeitos de palco de Curtis, a semelhança física e a forma como se doa ao papel, principalmente nas apresentações ao vivo, coloca sua performance ao lado das recentes atuações mediúnicas do cinema biográfico-musical a exemplo de Jamie Foxx em Ray (2004), Marion Cottilard em Piaf (2007) e Val Kilmer em The doors (1991).
Em contrapartida, os diálogos deixaram um pouco a desejar. Em diversas ocasiões os espirituosos integrantes do Joy Division ficam parecendo meninões abobalhados, com a artificialidade recorrente na grande maioria dos filmes que tentam reproduzir a convivência das bandas de rock (lembrei-me inclusive do emburrado Holden Caulfield, protagonista d’O Apanhador no Campo de Centeio, que diz detestar filmes porque os atores nunca conseguem “falar como gente normal”). A diferença entre o Joy Division real e o Joy Division pintado em Control fica clara na hora em que em que os atores reproduzem uma entrevista original dada pelo grupo e prontamente aparecem respostas bem mais divertidas e perspicazes do que qualquer outra coisa que tivessem dito até então.
Agora se teve uma coisa na qual o diretor Anton Corbjin acertou em cheio, além de escalar Sam Riley para o papel principal, foi fazer o filme em preto-e-branco. Caiu como uma luva, se me permitem o clichê. Além de ser perfeita para representar o universo lúgubre que devia ser a cabeça de Ian Curtis, é também o par ideal para a cinzenta e deprimente Manchester dos anos 70. Também não é nenhuma surpresa: Anton é bem mais reconhecido pelo seu trabalho como fotógrafo do que como cineasta, e alguns dos retratos mais famosos de Ian foram obra dele. Apesar da fotografia diferente, no entanto, a narrativa é bem convencional e previsível, o que contrariou as minhas expectativas.
Por se tratar da vida de um compositor tão visceral, imaginei um cinema mais experimental e hermético, a exemplo de Last Days (2005), de Gus Van Sant, filme de arte que também retrata a depressão e o suicídio de um popstar (nesse caso específico Kurt Cobain, vocalista do Nirvana). Só que Gus Van Sant acabou fazendo um filme arrastado e entediante, enquanto Anton Carbjin tinha uma boa história nas mãos e soube usá-la, tirando inclusive grande proveito da trilha sonora. Claro que se Anton fosse mais ousado o resultado poderia ter sido melhor, mas não arriscar também traz a importantíssima vantagem de não perder. Convenhamos, não adianta ter boas idéias se no final das contas ninguém acaba entendendo nada.
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Boa mesmo é a resenha de "Tudo que o céu permite" de Matheus!
ResponderExcluirNathalia
Atendendo a pedidos, postei a resenha...
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