terça-feira, 20 de março de 2007

"Trilogia das Cores" por Cecília Almeida


Sobre as cores da humanidade
“As pessoas realmente querem liberdade, igualdade e fraternidade? Não é só uma figura de linguagem?” Krysztof Kieslowski
Dos milhares de filmes que uma pessoa pode assistir durante a vida, não serão todos os que irão causar algum impacto emocional e psicológico. Para dizer a verdade, esse número normalmente é bem pequeno, pois não basta simplesmente que a obra traga um tema relevante, ou uma atuação surpreendente, ou até uma direção de fotografia agradável aos olhos. Para que um filme seja de fato significativo, ele precisa dialogar com o momento pessoal do espectador, com sua bagagem emocional e psicológica. Tal sincronicidade é rara, de modo que certas produções só podem ser plenamente apreciadas em determinados estágios de nossas vidas. Algumas irão exigir um grau elevado maturidade, enquanto outras pedem justamente o contrário. De qualquer forma, sempre haverá aqueles memoráveis momentos em que um filme nos leva além da experiência de simplesmente assistí-lo. Quando nos voltamos para nós mesmos e questionamos nossos valores, nossa maneira de enxergar o mundo. Se pudesse contar numa mão quantos filmes já me proporcionaram esse efeito, certamente teria que colocar três deles num só dedo. Três, que se completam em sentido e forma, que se enxertaram por dentro de minha pele e serviram de gatilho para infinitos questionamentos e reflexões. Três retratos da natureza e comportamento humanos, cada qual pintado à sua maneira, com suas próprias nuances, com sua própria cor.
Estou me referindo à “Trilogia das Cores”, como ficou conhecido o mais famoso conjunto de filmes do diretor franco-polonês Krysztof Kieslowski. A trilogia é composta pelos títulos “A Liberdade é Azul” (Bleu - 1993), “A Igualdade é Branca” (Blanc - 1994) e “A Fraternidade é Vermelha” (Rouge - 1994). Embora tenha sido a tradução para o português que incluiu os lemas da Revolução Francesa, eles acrescentam muito ao significado dos filmes, como analisaremos a seguir.
No primeiro, a liberdade é aquela sensação estranha de não ter mais apego a nada. De não ter mais nenhuma ligação com qualquer pessoa ou coisa, nenhuma responsabilidade, nada. Ela é azul, pois aqueles que experimentam essa liberdade, como a personagem principal da obra, percebem cedo ou tarde que sua vida é esvaziada de sentido, nostálgica e melancólica.
A seqüência fala de justiça. A justiça que alguns homens merecem depois de sofrerem a pior das humilhações. Este é o único dos três filmes protagonizado por um homem e também o mais bem humorado. O protagonista, depois de passar por situações tragicômicas, se esforça para ter o respeito daquela que o destratou. Por isso, a cor branca. Além de ser a cor da leveza, ela se forma a partir da reunião de todas as outras, juntas, iguais.
Por último, o ato de conclusão de uma trilogia sobre o ser humano e suas paixões, seus relacionamentos e ligações com o mundo. Não há outra cor, se não o vermelho, para representar isso. Reunindo os conceitos anteriores, o capítulo final chega a ser uma fábula contemporânea. Explora os sonhos, o imaginário, a fantasia, a beleza. A fraternidade é uma das coisas que move o homem, e ela pode ser encontrada nas relações mais esquisitas e absurdas, cheias de pequenas coincidências.
Veremos como Kieslowski questiona – e até deconstrói – as noções de liberdade, igualdade e fraternidade, numa breve apresentação de cada filme. Ao criar esses personagens microscopicamente detalhados, o diretor explora suas naturezas complexas e contraditórias em situações extremamente peculiares, que servem de metáfora para representar os três lemas abordados. Para compreender como, vale analisar as partes antes de pensar-se no todo.

A solidão em liberdade
Julie: Agora entendi o que preciso fazer: Nada.
Não quero bens, presentes ou vínculos.
Tudo isso são armadilhas.
Não sei se isso é comum a outros idiomas, mas, em inglês, a palavra blue (azul) também é um sinônimo de tristeza. Ouvimos por aí a expressão “I’ve got the blues” – literalmente “estou com o azul” – para justificar e ilustrar um estado de espírito angustiado, depressivo. Se seguirmos por essa linha de raciocínio, não é preciso ir muito longe para entender a relação entre a cor e a história do primeiro filme da Trilogia. “A Liberdade é Azul” só poderia ser uma obra que versa sobre a melancolia humana.
O universo é o de Julie Vignon (Juliette Binoche). Lá, não há mais nada desde que seu marido e filha morreram num acidente de carro do qual ela foi a única sobrevivente. Agora, só existe ela. Existe, apenas, porque ela não mais vive. A tragédia mudou sua maneira de ser e a fez decidir que, se não tinha coragem de se matar, também não viveria. A partir daí, ela inicia um meticuloso e detalhista processo de reclusão. Começa a esvaziar sua vida de qualquer significado e conteúdo, se desapegando de tudo e todos que a cercam. Não haveria mais mágoa se não houvesse mais sentimentos, então ela se dedica a matar o pouco que lhe sobrou, na tentativa de encontrar algum alívio. Durante toda a história, ela tenta se desprender desesperadamente do mundo exterior, para conseguir descansar. Para sua frustração, ela descobre que não é possível se desligar a tal ponto, pois sempre haverá algo que a puxa de volta para o mundo dos vivos, quase por inércia.
O foco de Kieslowski está justamente nessa corda invisível, que salva Julie de sua estagnação. O que poderia despertar essa mulher de sua dormência, depois que ela perde tudo que considerava como vida? Cada um de nós leva consigo sua própria corda de proteção, mesmo sem consciência disso. Algo que, a princípio, rejeitamos em favor da sensação da queda, do desprendimento: da liberdade. Mas, que inevitavelmente, nos leva de volta ao chão, e que nos dá o impulso necessário para recomeçar. Para Julie, a corda invisível é a sinfonia inacabada de seu marido. Inacabada, largada pela metade, assim como as três vidas daquela família. Sempre que fecha os olhos, a partitura incompleta ganha vida e som em sua mente. É assim que ela descobre que, por mais que ela tentasse se desfazer das coisas materiais, ela nunca escaparia ao seu passado. Ela poderia tentar viver em silêncio, mas suas lembranças, unidas ao acaso, não permitiriam. É a música de seu marido que a traz de volta à realidade, é essa melodia o que resgata a pouca humanidade que restou viva dentro da heroína.
O azul é pincelado nos pequenos detalhes, representando simbolicamente o universo interior da protagonista. Azul era a cor do quarto da filha, assim como o pirulito que tinha nas mãos antes de morrer. Azul é a iluminação predominante que se reflete no rosto cansado de Juliette Binoche. Através da cor, a psique da personagem se constrói, de maneira que o espectador sensível pode perceber exatamente as nuances de cada um de seus sentimentos somente pela narrativa imagética de Kieslowski. Embora os diálogos estejam lá, e tenham a sua importância, eles não são necessários para que a platéia compreenda o que Julie pensa ou deseja. A estética de “A Liberdade” é arquitetada justamente para esse fim, transportando os olhares do público para a mente da personagem, numa experiência transcendental. Por isso, a narrativa é lenta, melancólica, nostálgica. Somos convidados a fazer parte daquele mundo azulado, acompanhando a personagem por dentro: sofremos com a sinfonia inacabada e torcemos para encontrar um alívio para aquela dor. Dor que não poderia ser mais familiar e universal. A dor da perda de um ente querido.
Negação, raiva, barganha, depressão, aceitação. São esses os cinco estágios que uma pessoa experimenta antes de ser puxada pela corda invisível. Julie os experimenta em seu processo de cura, e o espectador tem a oportunidade de vivenciá-los junto a ela. A personagem não chora a sua perda. Ela simplesmente abandona a casa de sua família morta e vai morar na cidade, na esperança de que o barulho exterior distraia seus pensamentos. Volta a usar seu nome de solteira, não mantém contato com ninguém de seu passado. Se pudesse, viveria reclusa, em silêncio, fugindo de suas lembranças. Mas a música de seu marido sempre toca mais alto. Ela obriga Julie a reviver sua dor, e daí vem a raiva. Raiva, porque ela não consegue ter seu descanso. Ela luta contra isso de todas as maneiras, tudo para tentar garantir sua vida reclusa, e, quando não consegue, o cansaço a invade. Em decorrência desse cansaço, em diversos momentos do filme a personagem cai numa depressão silenciosa e solitária. É isso que significa ser livre? Se isolar do mundo, se distanciar com frieza e desapego? Se esforçar tanto, a ponto de perder as forças, para segurar as lágrimas? Será que é isso mesmo que Julie queria? Não. O verdadeiro descanso vem quando finalmente ela pára de lutar, e chora. Aí, a nossa heroína aceita sua tragédia: a música que a assombrava passa a ser a origem de sua sanidade. Ela volta a atar laços com as pessoas ao seu redor, se permitindo a sentir novamente. Enfim, ela compreende que aquela sensação de queda livre não poderia ser infinita, pois, eventualmente, ela sentiria o chão. Assim, ela se deixa puxar pela sua corda invisível, de volta para aquele mundo em que ela não é livre, mas, ao menos, pode tentar ser feliz e amar novamente.
Poucas vezes o sofrimento humano foi colocado em tela de maneira tão íntima. Julie Vignon pode se mostrar enigmática ou estranha para as outras personagens da trama, mas a platéia que simpatiza com ela pode enxergar além de sua armadura. Sabemos que ela é vulnerável, e podemos facilmente nos identificar com sua perda. Aliás, a narrativa visual de Kieslowski é tão poderosa que nos leva não só à compreensão da personagem, mas à vivência dela. Passamos a nos sentir tão frágeis e expostos quanto ela. Como se pudéssemos finalmente compreender o que é a liberdade. E como ela é vazia.
Lucille: Você salvou minha vida.
Julie: Eu não fiz nada.
Lucille: Eu pedi, e você veio. É a mesma coisa.

Igualdade e separação
Dominique: Se eu digo que te amo, você não entende.
E se digo que te odeio, você também não entende.
Nem entende que o desejo, e preciso de você.
Entende?
Depois de um exercício pesado de introspecção, nada melhor do que uma comédia romântica. E, embora esse conceito tenha se tornado quase pejorativo, é isso que “A Igualdade é Branca” é. Sempre com a delicadeza e sutileza que lhe são particulares, Kieslowski muda o tom para algo mais leve, mais ameno. Talvez por isso esse seja considerado por muitos como o capítulo mais fraco da trilogia.
A história não teria absolutamente nada a ver com o primeiro, não fosse por uma cena que acontece nos dois filmes. É a cena do divórcio entre o herói e a mulher por quem ele é perdidamente apaixonado. Detalhe importante: os dois mal compartilham o mesmo idioma, pois ele é polonês e ela, francesa. Apaixonaram-se apesar das barreiras da língua. Agora, a esposa não quer mais o marido, pois eles deixaram de se comunicar na mais básica das linguagens – a do corpo. Karol Karol (Zbigniew Zamachowski) é impotente, incapaz de satisfazer Dominique Vidal (Julie Delpy) sexualmente.
Na seqüência inicial do filme, ele anda desajeitado com suas roupas pouco elegantes em direção ao tribunal. No meio do caminho, pára para observar uma pomba, que retribui jogando fezes no seu ombro. Essa cena define a natureza de Karol Karol e sua relação com o mundo: ele é traído pela própria ingenuidade. O rapaz é a representação universal do típico perdedor. É desajeitado, baixinho, com a insegurança comum aos estrangeiros num país em que desconhecem a língua. Seu único bem de valor, na França, é Dominique. E nem isso ele conseguiu manter. Ele perde o dinheiro, a virilidade e o pouco de respeito que lhe resta. Em todo o restante da trama, ele se dedica a recuperar tudo o que perdeu. Para tornar-se digno de sua esposa... Depois de humilhá-la como ela o humilhou.
A noção de justiça de Karol Karol, vista de fora, poderia ser considerada um tanto mesquinha – e é. Mas, ao assistir ao filme, o espectador se solidariza com o pobre coitado. Dominique, apesar de ser cruel em vários momentos, também merece a compaixão do espectador. Quando ela finalmente recebe a punição por tudo o que fez ao ex-marido, ela revela seu lado mais doce, frágil, humano. Ela não é uma vilã, embora pareça ser nas cenas iniciais.
Da primeira vez que vi “A Igualdade”, confesso que concordei com a opinião geral. Embora tenha me divertido com a “volta por cima” de Karol, tive a impressão de que o tema era menos profundo, talvez leve demais – como se apenas as situações pesadas pudessem nos ensinar algo. Revi o título recentemente, e mudei de idéia. Percebi o quanto essa obra é subestimada. Sua doçura e simplicidade abrem os olhos para as pequenas coisas da vida. Karol e Dominique se amam, embora exista uma barreira de comunicação enorme entre eles. A princípio, são as diferenças que os separam, e é por isso que ele insiste em tentar ser “igual”. Mesmo que por intenções perversas, Karol acaba se tornando um homem melhor para Dominique. A mulher também aprende a baixar a guarda e perder o orgulho, admitindo que o ama, na cena final e mais bela do filme. Ambos tornam-se pessoas melhores, como se tudo o de ruim que aconteceu entre eles tivesse sido realmente necessário para a evolução do casal. No entanto, a igualdade conquistada é justamente aquilo que os separa: Dominique agora está presa, enquanto Karol precisa viver escondido para que ninguém o reconheça.
O desejo de Karol não é nem um pouco magnânimo ou bem intencionado. Sua idéia de igualdade – que, pensando bem, se aproxima mais de superioridade – o leva a atitudes extremas e absurdas, que trazem sua recompensa. E, ao experimentar isso, ao perceber que havia concretizado seu plano, ele se percebe infeliz. Mais um dos tapas de Kieslowski sobre a natureza humana: será que realmente desejamos ser livres e iguais? Julie era livre, desamarrada de tudo e todos, mas precisou abdicar de seus sentimentos para isso. O mesmo acontece aqui. Quando Karol dá à Dominique o mesmo tratamento que ela lhe deu, ele percebe que precisou abrir mão do amor da sua vida para isso. Não podem ficar juntos, se forem iguais. Por sorte, a mesma lição serviu para ela, e os dois parecem finalmente dispostos a conviver com o fato de que não são iguais. E nem precisam ser, se forem capazes de compreender um ao outro, apesar das diferenças.
Dominique (em linguagem de sinais):
Quando eu estiver livre, e sair dessa prisão,
Iremos embora ou ficaremos aqui, juntos.
E casaremos novamente.
Juntos.

Fraternidade ou egoísmo?
Valentine: Sinto que algo importante
Está acontecendo ao meu redor.
Isso me dá medo.
Se em “A Liberdade é Azul” aprendemos que há uma corda invisível segurando cada um de nós ao mundo, em “A Fraternidade é Vermelha” descobrimos as pequenas linhas que nos unem a todas as outras pessoas. Nenhuma ação, por menor que seja, é isolada. Tudo o que fazemos, intencionalmente ou não, acaba repercutindo numa outra vida, que pode estar bem próxima de nós. Cada detalhe de nossa rotina se reflete em algo maior. Todos estamos inadvertidamente interligados. Seja por um cachorro, ou por uma ligação telefônica, ou até por uma fotografia publicitária.
Valentine (Irene Jacob) é uma ingênua marionete desse plano superior. Sua vida pode ser trivial ou ordinária, sem nada de especial, mas ela o é. Ela é jovem, cheia de boas intenções e sentimentos. Não quer muito, além de ajudar os outros. Se sentir útil. Ser fraterna. Ela descobre que talvez não seja tão magnânima quando conhece um juiz aposentado (Jean-Louis Trintignant), depois de atropelar sua cadela. Cínico e amargo, o velho passa seus dias ouvindo conversas telefônicas de seus vizinhos. Isso horroriza Valentine, mas logo seus valores são colocados em jogo: ela é generosa porque quer o bem alheio, ou apenas para se sentir de consciência mais leve? Suas atitudes fraternas são realmente altruístas?
A partir daí, uma amizade peculiar começa a nascer entre os dois. Enquanto ele a abre os olhos, a ajudando a rever suas escolhas, ela o presenteia com um pouco de juventude. Em determinado momento, ele a explica que não se precisa fazer muito para afetar a vida de alguém. Apenas por existir e fazer o melhor para ela mesma, Valentine poderia inspirar e mudar os outros. Ela termina fazendo isso com o próprio juiz, e os dois descobrem o verdadeiro sentido da fraternidade.
Mas “A Fraternidade é Vermelha” não se resume somente a esses dois. Não, pelo contrário: aqui, a preocupação de Kieslowski é o universo que os cerca. Universo cheio de minúsculas coincidências que unem e separam os homens. O acaso – ou seria destino? – está por toda parte. O espectador sente durante toda a obra uma sensação constante de dèja vu, tanto por parte dos personagens quanto por parte dos cenários. A construção estética do filme se preocupa em dar essa idéia de ciclo, gerando um acúmulo de informações visuais que se repetem. Se repetem, inclusive, em personagens diferentes, de gerações diferentes. A história do juiz é muito parecida com a de um jovem estudante de direito, vizinho de Valentine, que ela nunca reparou. Mas o acaso fará com que esses dois se encontrem no ponto de convergência dos três filmes, e, assim, Valentine terá a chance de mudar o presente do juiz através do futuro daquele rapaz.
Ao final, descobrimos porque acompanhamos a vida daqueles indivíduos no decorrer dos três filmes. Eles estavam, sim, unidos por algo invisível: o acaso. Os três segmentos se fecham num círculo interminável de coincidências e retornos. Kieslowski confessa sua obsessão pelo tema, falando sobre uma cena específica de “A Liberdade é Azul”. “As notas musicais estão aí, dispersas, esperando por alguém que as ordene. Se dois homens, em dois lugares diferentes, pensam a mesma coisa, isso é um sinal de que eles estão unidos por algo”. Isso é ainda mais claro no último ato da trilogia, que conclui de maneira majestosa todos os temas abordados anteriormente.
Valentine: Se ao menos pudesse ajudar.
Joseph: Você pode: seja.
Valentine: O que quer dizer?
Joseph: Apenas isso. Seja.
Linhas invisíveis
Quando temos a noção de conjunto da trilogia, podemos traçar o percurso evolutivo de cada filme. Kieslowski sai do minimalismo individual de “A Liberdade é Azul”, passa pela relação de um casal em “A Igualdade é Branca” para finalmente chegar no universalismo de “A Fraternidade é Vermelha”. A trilogia cresce dentro de si mesma e sai dos personagens para abarcar um tema ainda mais global do que os três lemas separados: a confluência de todos eles. A trilogia tenta chegar, e consegue, na própria representação dos desejos e anseios humanos. As linhas invisíveis, cujos únicos rastros visuais são as três cores, permeiam os filmes, passam por entre os personagens e alcançam o espectador. A trilogia completa acabou sendo o último trabalho de Krysztof Kieslowski, e consagrou-se como sua obra prima.
Julie, Karol, Dominique, Valentine e o juiz são personagens vivos, detalhados e bem articulados. Seus universos podem ser fictícios, mas eles têm uma alma extremamente realista. São humanos, passando por experiências humanas e aprendendo com elas. Talvez, por isso, tenhamos muito a aprender com eles também. Se Kieslowski pretendia que houvesse uma lição específica, eu não sei. Na verdade, até diria que não. Não há uma “moral da história” bem definida e mastigada para o espectador compreender. Mas é inevitável que o olhar sensível absorva algo dessas três histórias que, embora dialoguem por diversas vezes com o absurdo e o bizarro, trazem alguns dos exemplos mais verdadeiros das relações humanas.
“Essas idéias [liberdade, igualdade e fraternidade] são contraditórias à natureza humana. Quando você lida com elas de maneira prática, não se sabe como conviver com elas”. Krysztof Kieslowski

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